Baixe Uso da espectroscopia funcional por infravermelho próximo (fNIRS) no estudo do TDAH e outras Manuais, Projetos, Pesquisas em PDF para Terapia ocupacional, somente na Docsity! 275 17 O uso da espectroscopia funcional por infravermelho próximo (fNIRS) como técni- ca de neuroimagem em pesquisas sobre o transtorno do déficit de atenção / hiperati- vidade (TDAH) a partir de uma perspectiva dimensional e de heterogeneidade Armando dos Santos Afonso Junior Izabella Trinta Paes Vera Lúcia Esteves Mateus Ana Alexandra Caldas Osório Walter Machado Pinheiro Luiz Renato Rodrigues Carreiro 276 TRANSTORNO DE DÉFICIT DE ATENÇÃO E HIPERATIVIDADE O Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) é caracterizado por sinais de desatenção e/ou hiperatividade / impulsividade, que resultam em impacto significativo na vida pessoal, acadêmica e ocupacional (1, 2). Afetando cerca de 5% da população infantil e 2,5% da população adulta, o TDAH é considerado um transtorno do neurodesenvolvimento, cujos sintomas estão associados a alterações cerebrais du- rante o desenvolvimento (2). O conhecimento sobre o TDAH e, consequentemente, a prática clínica que se sustenta nele, possui uma evolução histórica que acompanha o progresso tecnológico e científico. Inicialmente, os sintomas foram descritos a partir da observação de comportamentos na infância, ainda em uma classificação rudimentar e com pouco embasamento biológico. Aos poucos, novos conhecimentos foram acumu- lados e uma imagem mais clara do quadro se formou, apesar de alguns erros de concei- tualização persistirem (por exemplo, atribuição dos sintomas à deficiência moral). A partir de estudos neuropsicológicos, foi possível identificar anormalidades cerebrais como base de déficits de atenção, hiperatividade e impulsividade excessivas, o que foi posteriormente corroborado por técnicas de neuroimagem disseminadas na segunda metade do século XX. A etiologia do quadro ficou ainda mais clara com o avanço de estudos genéticos que identificaram fatores poligênicos associados ao TDAH (16). Ao longo do tempo, o TDAH foi visto, inicialmente, como uma deficiência moral e, posteriormente, como um transtorno hiperativo, que poderia ser acompanhado por desatenção ou como um transtorno com diferentes apresentações, diferentes níveis de severidade, entre outras facetas (16); e não há razão para acreditar que atingimos o ápice do conhecimento sobre o TDAH. Conforme novas tecnologias se tornam disponí- veis e novas teorias agregam evidências, é esperada uma mudança na prática e pesqui- sa envolvendo o transtorno. O seguinte capítulo discorre sobre como a tecnologia de Espectroscopia Funcional por Infravermelho Próximo (fNIRS) pode ajudar a aprofun- dar o entendimento sobre o TDAH. Inicialmente serão apresentadas as questões de heterogeneidade e dimensionalidade do transtorno, que são pontos altamente discuti- dos atualmente, para, em seguida, introduzir a técnica de fNIRS e sua colaboração nes- sa discussão. Em tempos recentes, uma série de estudos tem destacado a heterogeneidade e o aspecto dimensional do TDAH, indicando a necessidade de mais uma mudança no mo- do como entendemos o transtorno (29). A heterogeneidade se refere aos achados de que a manifestação do TDAH é mais diversa do que foi considerado inicialmente, de tal forma que indivíduos diagnosticados com o transtorno podem apresentar diferentes fatores etiológicos, alterações cerebrais e déficits cognitivos e comportamentais (18). Já o aspecto dimensional é relacionado com os achados que apontam que os sintomas do TDAH são mais bem entendidos como traços distribuídos de modo contínuo por 279 categorias e a prática clínica de como proceder nesses casos recebe consideravelmente menos atenção. Um dos principais problemas desses modelos é a negligência de pessoas que apre- sentam sintomas suficientes para impactar suas vidas, mas não suficientes para rece- ber diagnóstico e tratamento apropriado (17). Estudos apontam que pessoas que apresentam alguns sintomas de TDAH, mas não o suficiente para atingir o critério di- agnóstico (por exemplo, três dos nove sintomas listados no DSM), apresentam mais prejuízos neuropsicológicos e impactos funcionais do que quem não apresenta sinto- ma algum, apesar desses prejuízos serem menores do que em indivíduos que cum- prem o critério completo, atestando para o caráter dimensional do transtorno: quanto mais sintomas, maior o prejuízo, independentemente de ultrapassar o ponto de corte estipulado (6). Essas pessoas, que constituem um grupo (significativo) subliminar de diagnóstico, quando não são ignoradas de um ponto de vista clínico, acabam por cair na vaga e nebulosa categoria de “não especificada / outro especificado”. Pessoas que apresentam alguns sintomas, mas não o mínimo exigido pelos manuais, fazem pouco proveito, inclusive, de pesquisas clínicas, já que não costumam ser incluídas nas amos- tras experimentais por não cumprirem o critério de inclusão dos estudos (4). Como resultado, é indefinido se os resultados de pesquisas sobre avaliação e intervenção são diretamente aplicáveis a essas pessoas e qual seria o melhor manejo nesses casos. Ainda não foi identificada, e alguns autores argumentam que provavelmente nun- ca será, uma entidade com limites categóricos reais para o TDAH, que exista para além de convenções sociais ou conveniência descritiva (21). De forma complementar, estu- dos neurobiológicos e genéticos corroboram o aspecto contínuo dos sintomas de TDAH. Estudos sobre alterações estruturais do cérebro apontam para uma relação li- near entre o afinamento cortical e a severidade de sintomas e déficits neuropsicológi- cos no TDAH, variando desde a ausência de sintomas até, gradualmente, níveis de di- agnóstico, sem evidência de descontinuidade entre os dois extremos (21). Na área da genética, estudos apontam para uma forte associação genética entre casos extremos do TDAH e casos subliminares, demonstrando que mesmo fatores etiológicos hereditários dão suporte a uma distribuição contínua dos traços de TDAH (5). Outra falha comumente apontada do DSM, é que seu conteúdo não condiz com a crescente evidência empírica de que transtornos mentais tendem a ser extremamente heterogêneos, fato comum a todos os transtornos psiquiátricos e não apenas ao TDAH (17). O TDAH, especificamente, é heterogêneo em relação aos seus fatores etiológicos, manifestações e trajetórias de desenvolvimento dos sintomas, comorbidades presen- tes e prejuízos neuropsicológicos (18, 19). Variações na combinação de fatores etioló- gicos provavelmente são responsáveis por variações nos correlatos neurais apresen- tados, o que resulta em diversos perfis cognitivos e comportamentais do transtorno (18). Dessa forma, diferentes pacientes que apresentam um mesmo diagnóstico podem ter manifestações únicas e que precisam de formas específicas de intervenção (23). O 280 uso de um modelo menos dependente de categorias bem estabelecidas, e que contem- plasse a heterogeneidade desses transtornos, permitiria que indivíduos fossem avalia- dos e tratados de acordo com suas capacidades e dificuldades específicas, individual- mente, integrando informações de diferentes níveis e contemplando a diversidade psi- quiátrica (22). ALTERNATIVA A SISTEMAS PSIQUIÁTRICOS CATEGÓRICOS Diferentes linhas científicas de pesquisa estão tentando propor soluções para o atual modelo categórico de classificação de transtornos mentais (11, 15). A alternativa mais popular defende substituir categorias bem definidas por diferentes domínios que possam ser avaliados individualmente, a partir de uma visão dimensional. Esses domí- nios constituem traços indicativos de psicopatologia que se distribuem por toda a po- pulação, em diferentes níveis, refletindo diferenças individuais em características não adaptativas (15). Por exemplo, a desatenção poderia constituir um domínio que varia desde níveis tão baixos que não causam interferência significativa, até níveis elevados o suficiente para interferir em múltiplas áreas da vida – com níveis intermediários, de prejuízo moderado. Seguindo essa linha, uma iniciativa influente é a do Research Domain Criteria (RDoC). O RDoC foi proposto em 2009 pelo National Institute of Mental Health (NIMH) como um sistema de classificação para fins de pesquisa, ainda sem utilidade clínica (4). Essa proposta surgiu de um consenso na área da saúde mental sobre a necessidade de incorporar dados empíricos no entendimento de transtornos mentais e apresenta uma abordagem dimensional de caráter neurobiológico, propondo a investigação e valida- ção de constructos dimensionais que mediam psicopatologias (4). Dessa forma, um de seus pressupostos básicos é que a manifestação de sintomas psicopatológicos está as- sociada com alterações cerebrais passíveis de serem identificadas e usadas clinicamen- te (11), o que tem base nas ciências biológicas (17). O principal destaque do RDoC é que ele propõe domínios baseados em constructos clinicamente relevantes e embasa- dos na neurobiologia e psicologia. Os diferentes domínios propostos (incluindo pro- cessos cognitivos, como atenção e percepção, e sistemas de valência positiva e negati- va) devem ser analisados em todo seu espectro de funcionamento, do normal ao pato- lógico, e a partir de diferentes unidades de análise (por exemplo, em nível genético, molecular, circuitaria cerebral e comportamental). Em longo prazo, a ideia é que os resultados de pesquisas que sigam esse modelo dimensional gerem informações sufi- cientes para a criação de diagnósticos mais confiáveis e válidos dentro da psicopatolo- gia, ao incorporar dados patofisiológicos que permitirão identificar alvos de tratamen- to, diferentes perfis de prejuízos e, por fim, criar uma ponte mais consistente entre pesquisa e clínica (11). 281 Considerando a história da medicina, o RDoC e sua abordagem neurobiológica mantém um caráter promissor. Modelos atuais pressupõem que seja possível diferen- ciar transtornos mentais a partir da observação da manifestação de sinais e do relato subjetivo de sintomas. No entanto, essa é uma técnica pouco precisa. Categorias base- adas em sinais e sintomas podem não representar os mecanismos fundamentais por detrás de uma dada disfunção, o que retarda o desenvolvimento de novos tratamentos que foquem em mecanismos patofisiológicos subjacentes (11). Esse tipo de progresso aplicado na clínica só é possível a partir do desenvolvimento de medidas laboratoriais de funcionamento biológico, que permitam a investigação objetiva de estados patoló- gicos e não patológicos. Como o RDoC põe ênfase no funcionamento cerebral psicopa- tológico, seu progresso depende do uso de técnicas modernas de neuroimagem que permitam a investigação do funcionamento cerebral para a identificação de disfunções associadas aos domínios propostos (11). A falta de suporte empírico para as categorias criadas no DSM constitui uma “crise de confiança na nosologia psiquiátrica” (5). Os problemas decorrentes de um sistema classificatório ineficiente de transtornos mentais são múltiplos e afetam não só a área clínica, mas também a pesquisa. Por exemplo, as diretrizes do DSM e da CID se torna- ram padrão para o financiamento de pesquisas, condução de ensaios medicamentosos e aprovação de novos tratamentos medicamentosos, criando uma “prisão epistemoló- gica” que exclui métodos alternativos (17). O atraso no progresso da psiquiatria, em comparação com outras áreas da medicina, é em parte atribuído ao modo como trans- tornos mentais são imprecisamente conceitualizados, o que não facilita diferenciações biológicas (13). Assim, o uso de técnicas neurobiológicas, como ferramentas de neu- roimagem, pode contribuir para formar uma nova visão mais biológica dos transtornos mentais, o que tem potencial para alavancar a eficácia diagnóstica e de intervenção. Em se tratando de transtornos do neurodesenvolvimento, como o TDAH, a fNIRS de- monstra ser uma técnica promissora na investigação dos componentes neurofisiológi- cos de psicopatologias. A TÉCNICA fNIRS A Espectroscopia Funcional por Infravermelho Próximo (fNIRS) é uma técnica de neuroimagem funcional que existe desde a década de 1990 e cujo interesse por parte da comunidade científica tem crescido exponencialmente (7). Um interesse especial pela fNIRS é apresentado pelas áreas relacionadas ao desenvolvimento humano, con- siderando as vantagens que a técnica proporciona, que serão apresentadas abaixo (36). De um modo geral, técnicas de neuroimagem funcional são úteis ao possibilitar a investigação do funcionamento cerebral diante de uma demanda específica, o que con- tribui para o entendimento da neurobiologia associada a habilidades cognitivas, emo- 284 magnética funcional (fMRI), a eletroencefalografia (EEG) e a tomografia por emissão de pósitrons (TEP). A fMRI possui maior resolução espacial (chegando a milímetros por voxel) do que a fNIRS, apesar de ter pior resolução temporal (~1 Hz). Além disso, máquinas de fMRI são grandes, de difícil transporte e com alto custo operacional (28). Se tratando de pesquisas sobre o neurodesenvolvimento, fMRI também possui as des- vantagens de ser altamente sensível a artefatos de movimento, demandar que o exa- minando permaneça deitado durante todo o experimento e emitir um ruído constante que pode incomodar pessoas mais sensíveis, que apresentem sensibilidade sensorial. As restrições de movimentos da fMRI impedem até mesmo que os examinandos falem durante o experimento, o que limita a possibilidade de respostas empregadas e preju- dica estudos que dependem da resposta oral do participante. A EEG, por sua vez, se destaca por sua excelente resolução temporal (mais de 1.000 Hz), apesar de ter uma resolução espacial limitada (5 a 9 cm) (28). A coleta de dados de EEG também é mais difícil em comparação à fNIRS, por depender da aplicação de material condutor no contato entre escalpo e eletrodos. Na fNIRS, apesar de tal material não ser necessário, é preciso tomar cuidado para desobstruir a região do escalpo abaixo dos optodos, re- movendo cabelos que possam gerar interferência no sinal. Além disso, é fundamental garantir que os optodos estejam corretamente posicionados de forma a abranger a região cerebral de interesse, e que estejam bem fixados na touca, minimizando, assim, a possibilidade de ruído no sinal. Por fim, técnicas como a TEP possuem a desvanta- gem de serem invasivas, dependendo da injeção de radionuclídeos nos examinandos, o que limita a quantidade de vezes que pode ser aplicada (30). O objetivo aqui não é fazer uma comparação detalhada e exaustiva sobre as técni- cas, mas simplesmente destacar a utilidade da fNIRS em pesquisas sobre o neurode- senvolvimento. E, apesar de essas técnicas serem diretamente comparadas, elas não são excludentes entre si. Diversos estudos têm se aproveitado das vantagens de cada técnica ao combiná-las em protocolos, como fNIRS-fMRI ou fNIRS-EEG. Por exemplo, combinar fNIRS com EEG é um método útil para aproveitar a maior resolução espacial da fNRIS com a maior resolução temporal da EEG (30). Assim, ao invés de alternativas, essas ferramentas podem ser vistas como complementares. APLICAÇÃO DA FNIRS NO TDAH Considerando suas características, a fNIRS tem valor inestimável na pesquisa do TDAH. Um dos principais motivos é a sua tolerância a artefatos de movimento. Como uma das características do TDAH é a hiperatividade, presente de forma exacerbada principalmente em crianças mais novas, de idade pré-escolar, uma dificuldade ineren- te à pesquisa de neuroimagem nessa população envolve evitar que os examinandos produzam artefatos de movimento durante a avaliação. A relativa tolerância da fNIRS a 285 esse tipo de ruído garante um sinal de maior qualidade, o que facilita a análise e infe- rência de ativações cerebrais. Além disso, a fNIRS permite uma investigação mais pro- funda do TDAH ao possibilitar que o experimento se dê em um ambiente natural para a criança ou, pelo menos, que ela possa emitir uma variedade maior de respostas, o que contrasta com a fMRI, em que a criança precisa ficar confinada dentro do equipa- mento e restrita a respostas motoras simples e artificiais, como apertar botões. Nesse sentido, a fNIRS possibilita, inclusive, apresentar estímulos auditivos e coletar respos- tas orais, o que é complicado na fMRI, por conta do ruído alto que o equipamento emi- te e das restrições de movimentos (30). Apesar das vantagens de técnicas desenvolvi- das na psicologia experimental, que envolvem apresentar estímulos artificiais, exigir respostas simples e manter o máximo de controle durante o experimento, é fundamen- tal desenvolver protocolos complementares, de maior validade ecológica, para apro- fundar a compreensão do funcionamento cerebral (26). A possibilidade de examinar comportamentos em contextos naturalísticos é espe- cialmente relevante no caso de pesquisas cujo alvo seja o córtex pré-frontal (CPF), uma região cerebral de interesse no caso do TDAH. O CPF é intimamente ligado a compor- tamentos voluntários emitidos em situações não estruturadas, com poucas restrições, em que não existe um único curso de ação que possa ser tomado e que, portanto, é ne- cessário o planejamento para a emissão de comportamentos apropriados. Inclusive, alguns autores argumentam que protocolos experimentais que visem investigar o CPF, mas apresentam controle excessivo do contexto experimental, podem comprometer a validade de constructo das tarefas realizadas, já que essas situações diminuem a de- manda do CPF e suas funções top-down, não sendo representativas de situações cotidi- anas (3). Dessa forma, a compreensão de como o CPF está realmente implicado no TDAH pode ficar comprometida se depender exclusivamente de estudos não naturalís- ticos. A maioria dos trabalhos já publicados com fNIRS, relacionados ao TDAH, se preo- cupou em investigar o controle cognitivo (20), que consiste na habilidade de ajustar o comportamento diante de novas demandas e cujo prejuízo é associado ao TDAH (24). De modo geral, esses estudos sugerem uma menor ativação do CPF no TDAH, indicado por uma menor concentração de HbO durante demandas cognitivas (20). Há evidência de atividades cerebrais atípicas em crianças entre 6 e 14 anos com TDAH durante a realização de tarefas de inibição, fortemente associadas com o controle cognitivo. Em comparação com um grupo-controle, crianças com TDAH apresentam aumento redu- zido de HbO em regiões frontais, sugerindo ativação frontal significativamente menor (10). No entanto, outros resultados também já foram encontrados. Por exemplo, Jour- dan Moser et al. (12) encontraram um consumo maior de oxigênio no córtex pré- frontal dorsolateral direito em crianças com TDAH durante a realização da tarefa Stro- op, indicado por um aumento de HbR, na ausência de aumento significativo de HbO. Weber et al. (37) também não encontraram diferenças na concentração de HbO entre 286 grupos-controle e TDAH durante a realização de tarefas atencionais. No entanto, os autores observaram que a concentração de HbR se manteve constante no grupo com TDAH, apesar de ter um aumento no grupo-controle, o que foi interpretado como uma menor capacidade de metabolização do oxigênio no grupo de crianças com TDAH, cor- roborando a hipótese de um funcionamento atípico do CPF. Notavelmente, esse tipo de análise só é possível de ser realizado com a fNIRS, que permite uma avaliação mais completa da resposta hemodinâmica, ao medir tanto a concentração de HbO quanto a de HbR. Por fim, a fNIRS é interessante para investigar a cognição social, cujo prejuízo pode ser associado ao TDAH (25). Inclusive, uma das principais vantagens atribuídas à fNIRS é sua utilidade em pesquisas da neurociência social. Um dos motivos, já citado, é que a fNIRS pode ser utilizada em situações mais naturalísticas, próximas àquelas em que a interação social ocorre. Por exemplo, ela pode ser aplicada durante uma intera- ção face a face, que é um dos contextos de interação mais comuns na vida diária (30). Além disso, a fNIRS tem sido recentemente usada em pesquisas que adotam a metodo- logia de hyperscanning, que consiste em analisar a ativação cerebral de mais de uma pessoa, simultaneamente (28). Ou seja, é possível investigar o funcionamento cerebral de duas pessoas durante uma interação social entre elas, o que pode elucidar pontos importantes sobre possíveis diferenças em nível da cognição social entre indivíduos com TDAH e com desenvolvimento típico. E, apesar de o hyperscanning ser possível com outras ferramentas, como a fMRI, a fNIRS facilita o processo ao possibilitar a divi- são dos optodos de um mesmo sistema entre diferentes indivíduos (28). CONSIDERAÇÕES FINAIS A fNIRS tem demonstrado seu valor na pesquisa do neurodesenvolvimento, tanto em casos de pessoas clinicamente saudáveis como em casos psiquiátricos ou neuroló- gicos. No TDAH, a principal área cerebral investigada é o CPF. Isso porque o TDAH é comumente associado a alterações na circuitaria pré-frontal-estriatal-talamocortical, sendo as regiões pré-frontais as áreas passiveis de serem investigadas pela fNIRS, por conta das limitações em nível da profundidade do córtex alcançada pela técnica. Ape- sar disso, corroborando a ideia de heterogeneidade do TDAH, há evidências de que uma série de outras regiões cerebrais podem estar implicadas no transtorno (32). Por isso, talvez seja necessário que estudos de neuroimagem adotem uma metodologia exploratória, buscando as bases neurais que estão associadas com prejuízos específi- cos. Por exemplo, diferentes perfis de funcionamento executivo já foram identificados no TDAH, com grupos que apresentam prejuízos inibitórios, na velocidade / flexibili- dade cognitiva ou nenhum prejuízo detectado (31). Seria interessante entender como o funcionamento cerebral difere entre esses perfis de TDAH, para aumentar a compre- 289 20. Mauri M, Nobile M, Bellina M, Crippa A, Brambilla P. Light up ADHD: I. cortical hemody- namic responses measured by functional Near Infrared Spectroscopy (fNIRS). J Affect Disord. 2018, 234:358-64. doi: 10.1016/j.jad.2017.11.087. 21. McLennan JD. Understanding attention deficit hyperactivity disorder as a continuum. Can Fam Physician. 2016; 62(12):979-82. 22. Musser ED, Raiker Jr JS. 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