Baixe Olavo de Carvalho - Tratado de Astrocaracterologia e outras Manuais, Projetos, Pesquisas em PDF para Psicologia, somente na Docsity! 1 1 OLAVO DE CARVALHO O Caráter como Forma Pura da Personalidade BREVE TRATADO DE ASTROCARACTEROLOGIA 1997 5 5 Casa II............................................................................. 189 Sol — Inteligência Intuitiva Realista ........................................................................189 Síntese............................................................................................................................................190 Exemplos....................................................................................................................................190 Saturno..................................................................................................................................................190 Aporia...............................................................................................................................................192 Síntese..............................................................................................................................................192 Exemplos......................................................................................................................................192 Comentários aos exemplos .......................................................................................192 Júpiter.....................................................................................................................................................193 Síntese.............................................................................................................................................194 Exemplos.....................................................................................................................................194 Marte ......................................................................................................................................................194 Síntese.............................................................................................................................................194 Exemplos.....................................................................................................................................195 Vênus .....................................................................................................................................................195 Síntese.............................................................................................................................................195 Exemplos.....................................................................................................................................195 Lua............................................................................................................................................................196 Síntese............................................................................................................................................196 Exemplos....................................................................................................................................196 Casa III............................................................................197 Sol — Inteligência Intuitiva Interpretativa .........................................................197 Síntese............................................................................................................................................198 Exemplos....................................................................................................................................198 Saturno..................................................................................................................................................198 Aporia..............................................................................................................................................200 Síntese.............................................................................................................................................200 Exemplos.....................................................................................................................................200 Júpiter.....................................................................................................................................................200 Síntese..............................................................................................................................................201 Exemplos......................................................................................................................................201 Marte .......................................................................................................................................................201 Síntese..............................................................................................................................................202 Exemplos......................................................................................................................................202 Vênus ......................................................................................................................................................202 Síntese.............................................................................................................................................203 Exemplos.....................................................................................................................................203 Lua.............................................................................................................................................................203 Síntese..............................................................................................................................................204 INTRODUÇÃO Reúno entre as duas capas deste livro alguns dos tex- tos que distribuí aos alunos do Curso de Astrocaracterolo- gia, em São Paulo e no Rio de Janeiro, entre 1989 e 1992. O curso foi inteiramente gravado em fita e, transcrito, sobe a quase três mil páginas datilografadas. Os textos escolhidos para a presente seleção representan os pontos de junção que articulam num todo as várias partes desse enorme conjunto. Podem, portanto, ser lidos com proveito separadamente do resto do curso. Constituem, aliás, uma introdução preparatória ao Tratado de Astrocaracterologia, que será a trascrição integral e corrigida do curso, acompanhada dos estudo de caso, realizados pelos alunos e por mim a título menos de prova que de ilustração do método astrocaracterológico. O Tratado deverá constatar de seis volumes, assim distribuídos: I — Astrologia Pura e Aplicada II — Astrologia e Caractelogia III — As Camadas da Personalidade IV — Conhecimento de Si e do Outro V — A Técnica da Astrocaracterologia VI — Estudos de Casos O Primeiro volume dará uma descrição crítica do estado presente do debate astrológico, explicando por que esbarra em enigmas sem solução, e propondo uma nova estratégia para o ataque ao problema das relações 10 10 Tento em vista o plano do Tratado, o leitor poderá localizar adequadamente os textos do presente volume no conjunto da ciência astrocaracterológica, na qual eles constituem, como foi dito, pontos de junção e luga- res privilegiados. Este volume não vale por si, é claro, mas é por ele que deve começar o estudo da astrocaracterologia, pois fornece a visão sintética daquilo que o Tratado desen- volverá em modo analítico. Se, aqui ou ali, os textos parecerem obscuros, isto se deve á razão de que síntese é brevidade e a brevidade, como já notava Horácio, é inimiga da clareza. Agradeço de todo o coração a Márcia Fonseca, a Meri Angélica Harakava, a Henriette Aparecida da Fon- seca e a todos os menbros da Sociedade Brasileira de Astrocaracterologia (SBA), de São Paulo e do do Rio de Janeiro, sem cuja colaboração este livro não teria sido escrito nem publicado. Mas aida é preciso acrescentar algo. Na aula inaugu- ral, proferida em São Paulo em abril de 1990, comuni- quei aos alunos que o Curso de Astrocaracterologia seria dedicado como homenagem ao Dr. Juan Alfredo Cesár Müller, o qual não se encontrava ali presente por razões de saúde. A primeira apostila , com a transcriçãop dessa aula, foi publicada algumas semanas depois. Enviei um exemplar ao Dr. Müller, que o leu com grande dificul- dade — mal enxergando as letras miúdas — na cama do hospital onde se encontrava internado. Sues filhos con- taram-me, depois, da grande alegria e satisfação com que o mestre leu até onde lhe permitiam suas forças as pági- nas em que se cristalizavam os frutos do seu ensinamen- to na gratidão e no trabalho de um discípulo. Foi sua 11 11 última alegria. Juan Alfredo César Müller faleceu naque- la mesma noite. O DEBATE QUE ENTROU EM ÓRBITA Ao longo das últimas décadas, a astrologia tornou-se um sucedâneo de religião para as massas de classe mé- dia e um hobby “espiritual” para os letrados. Montada na onda do novo paradigma que alguns teóricos reclamam para a ciência no século XXI, ela ganhou mesmo ares de respeitabilidade em muitos círculos acadêmicos. Nada parece deter sua ascensão. Até as reações hostis de al- guns religiosos e homens de ciência apenas aumentam sua popularidade. No mínimo, o que é objeto de debate é objeto de atenção. No entanto, os debates, na sua quase totalidade, têm se limitado aos aspectos mais vistosos e periféricos da questão astrológica, sem fazerem avançar um passo se- quer o esforço para responder às perguntas que consti- tuem, ou deveriam constituir, o miolo do problema: existe, objetivamente, uma relação entre os movimentos dos astros no céu e o desenrolar da vida humana na Te r- ra? Se existe, qual a sua natureza e o seu alcance? Quais as causas que a determinam? Quais as possibilidade e os meios de conhecê-la cientificamente? Em vez de enfrentar essas perguntas, os adeptos e adversários da astrologia preferem discutir o seguinte tópico: “Astrologia funciona?” O debate toma por foco a astrologia como prática divinatória ou diagnóstica, e deixa de lado a questão das influências astrais propria- mente ditas. Aparentemente, nenhum dos partidos em disputa se deu conta de que a existência ou inexistência de influências planetárias sobre a vida humana, de um 16 16 lado, e de outro a eficácia ou ineficácia da ciência ou pseudociência que se gaba de conhecê-las, são questões perfeitamente distintas, e de que não se pode decidir segunda sem haver antes dado à primeira uma resposta satisfatória. Pois o que define e singulariza a astrologia não é a afirmação genérica de que “existem influência astrais” (a qual pode ser admitida até mesmo por quem odeie astrologia, como Sto. Agostinho, por exemplo), mas sim a pretensão de já possuir um conhecimento ca- bal de suas manifestações e variedades, ao ponto de po- der descrever meticulosamente as diversificações da influência de cada planeta conforme o lugar que ocupe no céu no instante do nascimento de cada indivíduo em particular — sem exceções ou dificuldades notáveis. Bem pode ser, é claro, que esta pretensão seja descabida, maluca mesmo, sem que por isto o fenômeno das influ- ências astrais, em si mesmo e independentemente das interpretações que os astrólogos lhe dêem, deva ser considerado inexistente. Por óbvia que seja essa advertência, os protagonistas do debate astrológico têm preferido omiti-la, confun- dindo a si mesmos e ao público. Invariavelmente, no calor da polêmica, cada pequeno indício da existência de influências astrais é tomado como argumento legiti- mador da prática astrológica existente; de outro lado, cada sinal de ineficácia ou erro dos astrólogos é exibido como prova da irrealidade das influências astrais. Isto em lógica chama-se um non sequitur: tirar à força, de uma premissa, conclusões que dela não se seguem logi- camente. Por exemplo, a pesquisa realizada por Michel Gauquelin, na França, que numa revisão de 500.000 ho- róscopos de nascimento encontrou uma correlação es- tatística altamente significativa entre grupos profissio- nais e tipos astrólogicos (conforme a posição dos pla- 17 17 netas na hora do nascimento), é brandida orgulhosamen- te pelos astrólogos como prova de que “astrologia fun- ciona” (e não somente de que “existem influências as- trais”). Inversa e complementarmente, o físico Shawn Carlson, da Universidade da Califórnia, após ter verifi- cado, em testes estatísticos, a incapacidade de vinte as- trólogos para identificarem traços de personalidade com base em horóscopos de nascimento, divulgou esse resultado (na revista Nature) como prova de que “não existem influências astrais” (e não somente de que a astrologia não funciona, pelo menos tal como praticada atualmente). Confusões dessa ordem são a regras geral nos deba- tes sobre astrologia, mesmo quando os debatedores são homens cultos e preparados. Numa recente mesa- redonda na UFRJ, confrontado com um sujeito que, para cúmulo, era professor de metodologia científica, não consegui, por nada deste mundo, fazê-lo compreender a inépcia de uma discurssão colocada nesses termos. Com os astrólogos, excetuando uns happy few, não tenho lo- grado resultados melhores. Coisas desse tipo contribu- em para fazer do debate astrológico um sinal particu- larmente enfático da demência contemporânea. No entanto, a questão das influências astrais, em si, e independentemente da polêmica, é da máxima impor- tância para a nossa civilização em seu estágio presente. Se nos lembrarmos de que a geografia se constituiu e se expadiu rapidamente como ciência a partir do momen- to em que uma Europa culturalmente unificada partiu para as navegações e a descoberta da Terra, é fácil per- ceber, por analogia, que a humanidade culturalmente unificada de hoje, ao partir para a exploração do ambi- ente cósmico em torno, se defronta com a necessidade urgente de um nova colocação do problema das rala- 20 20 A tremenda importância dessas observações reside em que elas colocam a questão astrológica na linha de uma investigação científica possível, tirando-a da esfera dos argumentos metafísicos e teólógicos sobre determinismo e livre-arbítrio. Mas, passados sete séculos, a lição do gran- de escolático ainda não foi assimilada, pois tais argu- mentos continuam comparecendo invariavelmente em toda discussão sobre o preblema astrológico, malgrado sua já demonstrada impertinência e esterilidade. O tratamento que Tomás deu à questão mostra, ade- mais, que ela pode e deve ser abordada independente- mente de quaisquer reivindicações polêmicas sobre a legitimidade ou ilegitimidade da astrologia enquanto prática. Esta lição também não foi assimilada. Em resumo, no século XII estávamos mais perto de uma colocação racional do problema do que estamos hoje em dia, justamente quando ele se revela mais im- portante e urgente. De outro lado, é claro que, se em vez de investigar diretamente o fenômeno astral continuarmos polemi- zando sobre “a” astrologia, não chegaram a nada. “A” as- trologia é um amálgama enorme e confuso de códigos simbólicos, mitos e preceitos empíricos, procedentes de épocas e civilizações diversas, numa variedade que se rebela contra toda tentativa de reduzi-la a um corpo unitário de doutrina. Como pronuciar-nos, de um só golpe, sobre a veracidade ou falsidade de uma massa tão heteróclita? Só a ignorância fanática ou o desejo de apa- recer explicam que alguém se disponha a tomar partido num debate que se coloque nesse ternos. Mas, se os in- teressados no debate astrológico estão atrasados de sete séculos em assimilar a lição de Tomás, é que estão atra- sados de vinte em assimilar a de Aristóteles, o qual en- sinava que, de um sujeito equívoco, nada se pode predicar 21 21 univocamente. “A” astrologia é muitas coisas. Ta lves al- gumas delas sejam verdadeiras, outras falsas, umas valio- sas, outras desprezíveis. Quando essa mixórdia milenar se houver transformado num corpo teórico explícito, à custa de depurações dialéticas e metodológicas como as que Sto. Tomás realizou para um aspecto em particular, então e somente então poderemos debater com provei- to sobre sua veracidade ou falsidade. Até lá, tudo o que podemos fazer é declarar, humildemente, se gostamos dela ou não. Quanto a mim, é claro que gosto. 25 25 5 — Cabe à Astrologia Geral, ou Pura, ou Teórica, definir, como mera hipótese teórica, e localizar coeren- temente no corpo da epistemologia vigente, as relações entre fenômenos terrestres e celestes. Cabe à Astrologias Especiais: (a) amoldar essa hipó- tese ao seu campo específico: (b) definir os métodos e critérios cabíveis no caso; (c) empreender as pesquisas necessárias; (d) corrigir e aperfeiçoar a hipótese espe- cial; (e) verificar em que medida essas correções e a- perfeiçoamentos afetam a teoria geral. 6 — Denominamos Astrocaracterologia o setor da As- trologia que estuda, especificamente e com métodos específicos, as relações entre a figura celeste no instan- te do nascimento de um indivíduo humano e o caráter desse indivíduo. 7 — Denominamos caráter a parte fixa e estrutural da personalidade; o esquema de base por trás de todas as mutações determinadas por fatores exógenos; o esquele- to da personalidade, e não o seu corpo total e vivente. 8 — São tarefas primordiais da Astrocaracterologia: a) Fazer uma revisão crítica de todas as principais teorias caracterológicas, como as de Klages, Le Snne, Berger, Bühler, e assim por diante. b) Estabelecer o quadro mínimo dos fatores e elemen- tos estruturais do caráter — abstraindo-se de toda espe- culação sobre as causas que os determinam. c) Estabelecer, por simples analogia estrutural, as correspondências entre esses fatores e elementos e os componentes do mapa astrológico — planetas, casas, aspectos, etc. — tomados isoladamente. Isto constituirá o primeiro esboço da hipótese astrocaracterológica. d) Estabelecer a possibilidade de uma particulariza- ção dessa hipótese; isto é, verificar se a analogia entre a estrutura do caráter em geral e o sistema planetário pode 26 26 ser transposta ao plano de uma correspondência entre a figura do céu num instante determinado e o caráter de um indivíduo determinado. Esta transposição, ao contrá- rio de que parece imaginar a maioria dos astrólogos, é altamente problemática. e) Desenvolver, por método dedutivo, a diferencia- ção dos fatores planetários segundo casas e signos. Isto constituiria o corpo total da hipótese astrocaracteroló- gica: o esboço da “técnica da interpretação” possível. f) Destacar, do conjunto dessa hipótese, os aspectos mais passíveis de comprovação ou refutação clínica (por observação de casos). g) Proceder às pesquisas, após o estabelecimento de métodos apropriados. h) Desenvolver métodos de observação experimental. 9 — O objetivo fundamental da Sociedade Brasileira de Astrocaracterologia é (a) transmitir a profissionais e estudantes a parte já realizada desse programa; (b) for- mar pesquisadores para realizarem a parte restante3. 10 — A Astrocaracterologia pretende ser uma con- tribuição para a elevação geral do debate astrológico, que de tem deixar de ser um confronto de preconceitos e equívocos, uma impossível peleja entre ocultismos. Nesta entrada do século XXI, quando o estreitamen- to do horizonte terrestre e a abertura do espaço cósmi- co às explorações científicas colocam, com máxima urgência, a questão das relações entre o ambiente cós- mico e a fenomenalidade terrestre e humana, é absolu- 3 A formulação metodológica prévia dos requisitos da Astrologia Geral ou Teórica já foi apresentada em nosso curso Astrologia: Ciência e Ilusão; as linhas mestras da metodologia astrocaracterológica, em nosso curso Astrologia e Caracterologia. Ambos estes cursos foram repetidos em São Paulo, no Rio de Janeiro e em Salvador. Suas transcrições foram colocadas à disposição dos membros da Sociedade, preparando-os para o Curso de Astrocaracterologia Fundamental . 27 27 tamente necessário um esforço para colocar essa ques- tão de maneira responsável, ao nível de um saber crítico e não dogmático. Se não o fizermos, outros o farão. Assim como se disse que a guerra é assunto demasiado sério para ficar nas mão dos generais, poderá dizer-se um dia que as re- lações entre astros e homens são coisa demasiado grave e grande para ficar entregue à responsabilidade de astró- logos. 30 30 opinião pública e das sociedades secretas, a autoridade das forças históricas, a autoridade do corpo que geme, deseja e comanda —, o homem moderno está sempre pronto a ceder a alguma delas o privilégio e o dever, a dor e a suprema glória de saber a verdade, coisa que só a ele compete e a ninguém mais. O homem real, o homem individual de carne e osso, histórico e contingente, pecador, mentiroso, frágil e nascido em prantos, é, não obstante todas essas defici- ências, o único que sabe e que pode saber, porque tem inteligência e autoconsciência. Ele não tem a quem per- guntar, exceto a esta inteligência autoconsciente deste último. Como tribunal da verdade, não há instância superior à consciência humana, porque é nela e para ela somente que a verdade existe. Se alguma premissa filosófica é indispensável acei- tar para poder compreender proveitosamente a Astro- caracterologia, é este firme reconhecimento do poder único e intransferível da inteligência autoconsciente de conhecer a verdade por esforço próprio e em meio a todas as limitações e precariedades da condição huma- na. Sem este reconhecimento, a inteligência se aliena, transfere a outrem a autoridade de conhecer por ela e em vez dela, e termina envilecida como serva de algum deus improvisado. A Astrocaracterologia versa sobre o mais difícil e escorregadio dos conhecimento: o conhecimento do homem pelo homem. Só uma inteligência firmemente centrada na consciência do seu poder e do seu dever pode com proveito dedicar-se e tal estudo. ASTROLOGIA E CIÊNCIA4 A pergunta “A astrologia é uma ciência?” tem obtido as seguintes respostas: 1ª É uma ciência. Assim respondem os adeptos da chamada “astrologia científica”, como Paul Couderc e Adolfo Weiss. Esta escola caracteriza-se por julgar que, para a astrologia ter direito ao estatuto de ciência, tudo o que é preciso é tomar as afirmações correntes dos manuais de astrologia e submetê-las a uma verificação estatística, que as confirmará em toda a linha. 2ª É uma pseudociência. É o que dizem alguns dos mais encarniçados adversários da astrologia, recrutados so- bretudo entre os astrônomos de profissão. Dentre eles destacam-se, como típicos, o falecido diretor do Obser- vatório de Paris, Paul Couderc, e, no Brasil, o diretor do Observatório do Valongo, Ronaldo Rogério de Freitas Mourão. As razões que fundamentam esta resposta são muitas — algumas perfeitamente impertinentes, como por exemplo a de que é impossível calcular horóscopos de pessoas nascidas no Polo Norte ou a de que os signos não coincidem com as constelações; mas algumas perti- nentes e razoáveis, como aquelas que se alegam o prin- cípio de falseabilidade de Popper ou os resultados nega- tivos obtidos em testes estatísticos. É importante notar que esta corrente entende como critério de cientifici- 4 Conferência proferida no auditório do Palácio Tiradentes (Assembléia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro) por ocasião dos festejos do 10º aniversário da Escola Astroscientia, em 22 de outubro de 1994. 32 32 dade da astrologia o mesmo, no fundo, que adotavam Choisnard e Weiss, apenas com a ressalva de que sua aplicação dará resultados negativos. 3ª É um saber revelado, superior à ciência — e como tal, furta-se a todo exame científico na medida em que não pode ser apreendida pelas categorias racionais. Esta resposta é defendida ou presumida, em geral, pelos que abordam a astrologia pelo lado da psicologia junguiana, da mitologia e dos estudos de simbolismo e que ao mesmo tempo têm uma atitude crítica face à ciência contemporânea. O famoso astrólogo Charles E. O. Car- ter é um deles. É um teosofista. Mas igual atitude encon- tra-se em René Guénon, temível adversário do teoso- fismo. 4ª É uma linguagem simbólica e, como todas as lingua- gens, escapa das categorias do verdadeiro e do falso, podendo ser julgada apenas por sua adequação e expres- sividade. É a atitude daqueles que abordam a astrologia também pelo lado do simbolismo, da mitologia, da psi- cologia — mas também da antropologia, da sociologia —, tomam no entanto como universalmente válidos os critérios da ciência moderna. É o caso de um Gaston Bachelard, de um Claude Lévi-Strauss e, em geral, da comunidade acadêmica. Alguns encaram a astrologia como um “corpo de crenças” que não cabe à ciência julgar, mas descrever e compreender em suas estruturas, relacionando-as com as da sociedade humana. Malgrado suas enormes diferenças e malgrado o fato de que parecem abranger totalmente a gama das alterna- tivas possíveis, todas essas respostas são falsas ou, pelo menos, inadequadas. A primeira delas — a tese da “astrologia científica” — é falsa pelas seguintes razões: 35 35 as. A linguagem em si não pode ser verdadeira ou falsa. O que é verdadeiro ou falso é o conteúdo das idéias que o homem expressa com a ajuda delas, as quais, por sua vez, não constituem um sistema de signos, mas afirma- ções sobre a realidade, com referência extra-linguística. Se a astrologia é uma linguagem, está fora do domínio do verdadeiro e do falso e nada pode predicar sobre o real. Ora, a prática astrológica universal consiste preci- samente em fazer afirmativas sobre a realidade — sobre o caráter e o destino das pessoas, por exemplo. 2. Das regras de uma linguagem é impossível deduzir o conteúdo do que nela se vai dizer. Se a astrologia é uma linguagem, não é um conhecimento, exceto de si mesma. No entanto, a pretensão de constituir um co- nhecimento é inerente à prática astrológica, antiga ou moderna, Ocidental ou Oriental. Essas quatro categorias de respostas resumem o essencial do que foi, no século XX, o debate da questão astrológica. Por elas, fica patente que esse debate não levou a nenhum resultado apreciável, e que, portanto, é necessário recolocar a questão desde suas bases, para tentar chegar a um quinto grupo de respostas, na espe- rança de que sejam mais consistentes. Começo por rever o sentido dos termos. Que é propriamente uma ciência? Todo estudioso do assunto sabe que as ciências reais (historicamente existentes) não servem, por si, como fundamento para uma resposta. Por indução, os traços que obteríamos seriam demasiado amplos e frouxos para poder abranger a História, a Antropologia, a Matemática, a Biologia, a Física Teórica, etc. Resta a alternativa husserliana de conceber a ciência como um modelo ideal de conhecimento, do qual se po- dem deduzir, como diferentes possibilidades de realiza- 36 36 ção, mais perfeitas ou imperfeitas, as ciências que se manifestaram historicamente e ainda outras ciências possíveis. Esse modelo impõe certas exigências para que um conhecimento possa aproximar-se do ideal científico: 1. Todas as ciências historicamente existentes procu- ram realizar, por variados meios, um ideal de saber fun- damentado, firme, oposto à mera opinião. A definição ideal de ciência implica como condições essenciais: 1. Evidência. O termo “evidência” aqui não significa “o dado” ou “o imediatamente apreendido pelos senti- dos”. Significa apenas aquilo que é certo e inegável por si mesmo, não requerendo prova. Mesmo as correntes de pensamento que não aceitam nenhum tipo de intui- ção do dado fundam-se em alguns princípios tomados como evidentes ou ao menos convencionalmente colo- cados fora de toda discussão. Esses pontos de partida são indispensáveis em toda ciência, e é inconcebível uma ciência que presuma poder prosseguir indefinidamente suas investigações sem referi-las a um ponto de partida. 2. Prova. 3. Nexo evidência-prova. 4. Caráter evidente (e não provado) do nexo mesmo. 2. Como condições existenciais, a ciência requer: 1. Repetibilidade do ato intuitivo referido à “mesma” essência. 2. Repetibilidade do fenômeno cuja essência é intuída. 3. Registro. 4. Transmissibilidade. 3. Esse ideal foi realizado, historicamente, segun- do modalidades variadas, calcadas nas ciências que casualmente obtivessem maior sucesso no momento. 37 37 1. Geometria (séc. IV a. C.) 2. Biologia [ classificação ] (séc. VI em di- ante: influência aristotélica tardia). 3. Dialética e Lógica (séc. XII em diante). 4. Matemáticas (séc. XV em diante). 5. Física mecanicista (séc. XVII em dian- te). 6. Biologia e medicina experimental (séc. XIX). - ao mesmo tempo: História. 7. Física matemática, lógica matemática, linguística, informática e neurobiologi- a (séc. XX). 4. A astrologia pode tentar em vão copiar o mo- delo de alguma delas ou, ao contrário, procurar constituir-se como ciência desde o ideal mesmo que define a idéia de ciência. 5. Só este último caminho é válido, porque o ob- jeto da ciência astrológica é radicalmente diver- so do de todas as demais ciências. Que objeto é esse? 1. O estudo das influências astrais? Não. 2. O estudo da personalidade à luz dos as- tros? Não. 3. É o estudo das relações entre fenôme- nos celestes e terrestres de qualquer natu- reza. 5. Pode a astrologia ser uma ciência? 1. Logo, a astrologia, se houver uma, é uma ciên- cia: 1. Comparativa. QUE É A ASTROCARACTEROLOGIA? 1 — Astrocaracterologia é a ciência que investiga as relações entre os fenômenos celestes e o caráter huma- no 2 — Seu objetivo é averiguar se tais relações existem e, caso existam, precisar sua natureza, seu alcance e suas modalidades. 3 — A Astrocaracterologia parte de uma hipótese alegada pelos astrólogos — a de que existem tais rela- ções — e procura precisá-la, reduzindo a uma formula- ção única e essencial a variedade de versões e interpretações que lhe dão os astrólogos, para em seguida poder averiguá-la cientificamente. 4. Dessa maneira, a astrocaracterologia pode ser compreendida quer como uma parte especial da astro- logia — de vez que estuda somente um campo delimita- do dentro da variedade de termas de que se ocupam os astrólogos —, quer como uma anti-astrologia — na me- dida em que trata como mera hipótese o que para os astrólogos é uma certeza prévia e na medida em que dá ao tema um tratamento diverso daquele que recebe da astrologia-, quer como uma astrologia reformada. Ela é de fato essas três coisa, conforme o ângulo por onde se veja. 5. a parte mais importante do trabalho desta ciência consiste, durante esta fase inicial, na formulação aprio- rística da hipótese astrocaracterológica. Esta se constitui de três grupos de proposições: 42 42 a) proposições concernentes à existência, natureza e limites das mencionadas relações; b) proposições concernentes à diversificação dessas relações em modalidades e níveis distintos; c) proposições concernentes à sua diversificação segundo os caracteres individuais humanos. Estes três grupos de proposições deverão ser obti- dos mediante redução fenomenológica da variedade de formulações e versões que o tema recebe da astrologia clássica e contemporânea; e, em seguida hierarquizada sistematicamente segundo seus nexos lógicos. Desta feita, estará formado, pela primeiro vez na his- tória, um corpo integral e coerente da teoria astrológica (na parte concernente em especial ao caráter humana). 6 — A astrocarcterologia parte da constatação de que a astrologia clássica e moderna não é nem clara nem coerente na formulação de suas alegação, as quais no entanto são em grande número. E, desta constatação, conclui serem prematuras e estéreis todas as discussões sobre a validade (ou não) de tais alegação, de vez que, como já ensinava Aristóteles, nada se pode predicar univocamente de um objeto equivoco. Para o astrocaracterólogo, a admiti, como hipótese também, que por trás da variedade por vezes alucinante do que alegam os astrólogos, pode haver uma unidade de intenção que haja escapado aos próprios astrólogos. Ca- so não existia de facto (o que somente o exame fenome- nológico das semelhanças e diferenças pode revelar), ainda assim essa unidade poderá ser construída artifici- almente pelo astrocaracterólogo, a título de unidade ideal . Dito de outro modo, pode ser que os astrólogos de várias épocas, com seu discurso arrevesado, frouxo, confuso e por vezes contraditório, estejam tentando 45 45 lendo os sinais sugestivos que lhe indicam a via do aper- feiçoamento. É astrólogo ainda Tomás de Aquino, que não crê numa coisa nem outra, mas nunca influência puramente física e pré-humana dos astros sobre a nossa fisiologia, sem alcance determinante nem qualquer sig- nificação espiritual direta. Também é astrólogo Jacques Halbronn, que não acredita em nada disso, mas na ação da humanidade histórica, que, projetando significações num céu neutro e praticamente inerte, e submetendo-se em seguida aos ritmos e ciclos do céu assim carregado de intenções, acaba por sofrer a retroação da máquina simbólica por ela mesma criada, a qual, ao longo do tempo, vem a adquirir força eficiente pela condensação dos ritmos e ritos no código genético. A unidade parece impossível, já mesmo ao nível da simples formulação inicial da natureza do fenômeno astral. No entanto, essa dificuldade é apenas aparente, pois a diversidade mesma acaba por limitar, pelo contraste e negação recíproca, o campo das teorias que poderiam ser subscritas, como um só corpo unitário de hipóteses, por todos os astrólogos. Pois aqui não se trata de abarcar tudo o que os astrólogos dizem, mas de excluir tudo aquilo que, negado por um ou por muitos astrólogos significativos, arrisque desfazer a unanimidade. Assim, por exemplo, a sentença “A astrologia o estu- do das influências astrais sobre o homem “já estaria ex- cluída da teoria unitária, porque alguns astrólogos im- portantes dizem que os astros não exercem influência nenhuma (sendo apenas sinais) e porque outros astrólo- gos se interessam pela influência que os astro possam exercer sobre criaturas não humanas, como os metais e as plantas. 46 46 9 — Procedendo assim por distinções, comparações e exclusões, a astrocaracterologia, na primeira fase de suas investigações, chegou a formula as bases da teoria astrológica unitária (em parte real ou histórica, em par- te puramente lógica ou ideal). Esta teoria abrange os seguintes capítulos, ou grupos de proposições: 1 — Teoria astrológica pura: definição da astrologia e delimitação do seu objeto. 2 — Teoria do método astrológico: exigências metodológicas mínimas para que uma astrologia possa vir a ser possível. 3 — Teoria astropsicológica: delimitação dos setores da vida psicológica humana onde um estudo astrológico pode tornar-se possível, e exclusão dos impossíveis. Dentre os campos possíveis, destaca-se o estudo do ca- ráter, definição que receber nas várias caracterologias criadas pela psicologia do século XX ( Le Senne, Szon- di, Jung, etc.). 4 — Teoria astrocaracterológia especial : delimitação dos aspecto do caráter humano que podem ser submeti- dos a uma comparação com os fenômenos celestes (e que compõem o que denominamos astrocaráter) e ex- clusão dos que não podem. 5 — Teoria astrocaracterológica especial : Diversifica- ção do astrocaráter, a) segundo as partes ou aspectos que compõem sua estrutura, b) segundo as individuali- dades humanas, diferenciadas pelas combinações dessas partes ou aspectos. 10 — A segunda fase da astrocaracterologia começa quando, formulado e hierarquizado logicamente esse corpo de hipóteses, se propõem métodos, técnicas e estratégicas para sua averiguação científica. Mas ainda preciso esclarecer alguma coisa quanto à primeira fase. 47 47 11 — A teoria astrológica pura propõe as seguintes te- ses essenciais: 1 — A astrologia é o estudo das relações entre fenômenos astronômicos e fenômenos terrestres de qualquer natureza. A astrocaracterologia demonstra que essa definição é a única suficientemente ampla para abranger todo o campo estudado pelos astrólogos e nada deixar fora de- le que seja do interesse dos astrólogos e nada deixar fora dele que seja do interesse dos astrólogos; e revoga todas as outras definições diferentes, demonstrando caso sua inviabilidade. Delimita, assim, o objeto material da as- trologia. 2 — Excluindo a astronomia e as ciências puramente filosóficas (metafísica, lógica), todas as outras ciências dizem respeito aos fenômenos terrestres (quando a fí- sica, por exemplo, estuda fenômenos celestes, o faz como auxiliar da astronomia). De outro lado, a astrolo- gia, ao estudar a relação entre fenômenos celeste e ter- restres, não os apanha em estado bruto, mas sim desde o ponto em que se encontram então elaborados, de um lado pela astronomia, de outro pela ciência referente ai fenômeno terrestre em questão (por exemplo, um ciclo histórico, a vida de uma planta ou molusco, o compor- tamento de um homem, objetos, respectivamente, da História, da Biologia e da Psicologia). Assim, todo estu- do astrológico compara algum conhecimento astronô- mico a algum outro conhecimento ciêntífico. E então chegamos à definição mais profunda e essencial da as- trologia, que consiste na seguinte tese: Astrologia é astronomia comparada. A astrocaracterologia demonstra que é assim em to- dos os casos e em todas as variedades de astrologia. 50 50 descabida em qualquer estudo astrológico. Isto porque nem estruturas fixas nem ciclos podem compor-se de tend6encias. Claro que uma estrutura pode ser origem ou causa de tendências, mas o que interessa à astrologia é unicamente o traço fixo por trás da tendência, e não esta em si mesma. Por exemplo, se, por seu caráter, um homem tem “tendência” a tornar-se romancista ou re- pórter, é porque, por trás dessa tendência, existe como característica fixa a inteligência narrativa. A dita tendên- cia é apenas a manisfestação externa e meramente pro- babilística desse traço fixo, e é este o que interessa uni- camente à astrologia. Do mesmo modo, se numa deter- minada fase de um ciclo um homem “tem tendência”a fazer isto ou aquilo, a abandonar seu emprego, por e- xemplo, é porque essa fase do ciclo produziu nele efe- tivamente certas mudanças internas, que se expressari- am nessa tendência ou noutra qualquer. O que interessa é ver, num ciclo, as mudanças efetivas, em cada fase, e não as “tendência”que delas decorram como mero flo- reio decorativo. Os traços fixos da estrutura caractero- lógica e as mudanças efetivas assinaladas nos ciclos constituem o único objeto da astropsicologia, de pleno direito; tudo o mais, sendo contingente, único, singular ou irrepetível, está fora do interesse dessa ciência, por menos que o percebem certos astrólogos, ou mesmo a maioria deles. A unidade da teoria unitária é, repito, uma unidade lógica, não uma opinião majoritária positi- va. 14 — A teoria astrocaracterológia investiga o que pode haver de fixo e imutável na personalidade humana, des- de o nascimento. Identifica, na personalidade humana, desde o nascimento. Identifica, na personalidade huma- 51 51 na, doze camadas diferentes (doze por constatação empí- rica, a partir de uma fenomenologia da personalidade, e não por qualquer intuito de simetria numerológica com o Zodíaco), das quais uma e somente uma, que denomi- namos astrocaráter, pode ser dita fixa e imutável e pode, portanto, ser objeto de comparação com o céu de nas- cimento, ou horóscopo. As outras onze camadas são: as disposições hereditárias (tendência); os hábitos linguís- ticos e padrões de referência adguirido do meio social; o caráter no sentido de Le Senne (isto é, o conjunto de tendências consolidado e estabilizado no indivíduo a- dulto); a persolidade intelectual transcendental ou auto- consci6encia global; o ego histórico, ou consciência do próprio lugar no conjunto da existência humana; o ego espirutual, ou consciência do próprio lugar no quadro do cosmo ou de uma escatologia (absolvição ou conde- nação no Juízo Final, por exemplo). Todas esta onze caem fora do campo astrocaracterológico. Traços pre- sentes nessas onze camadas só podem se estudados as- trologicamente após e mediante a investigação de suas remotas raizes no astrocaráter. Este estudo se faz por redução das causas prováveis que determinaram o surgi- mento desse traço em particu;ar; e só quanto este surgi- mento não pode ser explicado por causas imanentes à camada em questão é que recorremos à hipótese de es- tarmos em presença de um traço astrocaracterológico. A investigação biográfica, para a consecução de tal fim, tem de ser extremamente minuciosa, o que causa sérias dificuldades de ordem prática para a pesquisa, limitando o número de seus objetos, e requerendo o concurso de muitos pesquisadores; com o fim de forma tais pesqui- sadores foi instituído um primeiro Curso de Astrocaracte- rologia, cujos alunos são portanto colocados, desde o início, na posição de coloboradores na investigação, 52 52 com todas as responsabilidades inerentes a esta condi- ção. Todos são alertados, desde a primeiro aula, para o fato de que irão participar ativamente do parto de uma nova ciência, de se que o sucesso das investigações de- pende da sua colobaração. O fundador da astrocaracte- rologia, que subscreve esta exposição, realizou até o momento algumas dezenas desses estudos biográficos, seja de personagens históricos, seja de sujeitos voluntá- rios vivos; e espera que, com a ajuda dos alunos, esse número possa subir para algumas centeans. Até o momento, os resultados preliminares permi- tem suspeitar que a maior parte dos erros dos astrólogos na descrição de personalidades consiste em que procu- ram encontrar, no horóscopo, traços pertencentes às onze camadas emncionadas, diretamente e sem a inter- mediação do conservqdor po progressista porque tem Satruno ou Urano na Casa IX; o que, sendo um traço da personalidade intelectual (9 camada) não pode ser indi- cado diretamente por nenhum dado horoscópico. De outro lado, notamos que muitas afirmações escandalo- samente errôneas dos astrólogos, na interpretação de horóscopos individuais, se revelam surpreendentemente verdadeiras quando as tomamos como meramente sim- bólicas (na camada em que se apresentam) e procura- mos, como seu “significado” ou sua “ intenção profunda” ( e mesmo inconsciente, de parte do astrólogo0, o traço astrocaracterológico que lhe correspondia, fazendo as devidas transposições de camada a camada. Este é caso de uma verdade obscuramente dita que passa por menti- ra (ás vezes aos olhos do próprio astrólogo, que nutre uma inconfessada suspeita de estar enganado em tudo quanto diz, o que torna a profissão particularmente neu- rotizante). 55 55 2. Lua = Sentimento ou variação do tônus interno por variação da energia externa ou interna. 3. Vênus = Fantasia ou capacidade plástica geradora de imagens independentemente da presença atual dos objetos respectivos. Como diziam os escolásticos, pode ser memorativa ou imaginativa. 4. Marte = Antecipação, conjetura ou ainda Vontade Reativa: cognição instintiva do potencial de ação e transformação iminentes de uma dada situação (corres- ponde ao que os escolásticos chamavam estimativa). 5. Júpiter = Vontade Pura ou Sinergia: conhecimento de si como fator causal e criativo; sinergia de todos os níveis da persolidade na consecução; de um ato ou na tomada de decisão livremente assumida; conhecimento da própria de decisão livremente assumida; conheci- mento da própria liberdade de agir, ou de si mesmo como causa. 6. Saturno = Razão: síntese representativa da totali- dade essencial da experiência num quadro coerente (ou tomado como tal) ; resíduo final das generalizações ob- tidas por experiência. Essas seis funções aproximam-se umas das outras por um parentesco espontâneo, agrupando-se em pares: Inteligência : intuitiva e racional: Sol e Saturna. Vontade : Pura e Reativa: Júpiter e Marte. Afetividade: Sentimento e Fantasia: Vênus e Lua. Há outras relações entre duplas, mas não interessam no momento. 18 — As doze direções da atenção são as seguintes: I — Auto-imagem corporal direta. II — Mundo sensível. III — Linguagem, significação, analogia. IV — Deseja e frustração. 56 56 V — Capacidade e farças atuais. VI — Esquema de distribuição habitual de energias. VII — Auto-imagem reflexa (o que só posso saber de mim pela reação alheia). VIII — Ação e reação iminentes. IX — Crenças formalmente admitidas. X — Lugar na hierarquia social. XI — Lugar no tempo histórico; plano de vida. XII — Tudo o que escapa ao meu horizonte, e que não obstante sei que existe fora do meu ëspaço vital”(no sentidode Kurt Levin). 19 — Cada faculdade tem seu correlato objetivo, ou objeto próprio. Por exemplo: a) A intuição capta presença real e singularidade. Tudo o que estiver na direção assinalada pelo Sol é apreendi- do pelo indivíduo como dado imediato, real, inquestio- nável. A intuição é, pois, o princípio de seleção dos da- dos. Por exemplo, para o indivíduo com Sol na Casa III as analogias e significações que de um objeto remetem a outro são tão “reais”e imediatas como, para o que tem Sol na II, o São as formas, cores, pesos sabores dos obje- tos materiais em torno, ou, para indivíduo com Sol na VIII, é “real”, como um dado, a iminência do que está para acontecer. Todos os indivíduos, é claro, acabam por tornar conhecimento do que se passa nas doze dire- ções, porém, não intuitivamente, e sim por dedução, in- dução, analogia, etc. A intuição, como captação de um dado enquanto realidade imediata, só opera numa dire- ção. Nas outras, tem de ser complementada pela inter- veção das demais faculdades. b) A razão capta a importância hierárquica dos dados num quadro de referência preexistente. É, portanto, o princípio da generalização (seleção e generalização no sentido de Piaget). Portanto, é na direção indicada por 57 57 Saturno que o indivíduo captar os dados que, a longo prozo, lhe parecerão mais importantes de mais longas consequências. Um evento captado na direção do Sol é apenas um dado, intensamente real no momento, mas que pode passa sem consequências; na direção de Satur- no, é fixado como matriz de generalizações. Eventos ocorridos nessa direção são encarados sempre do mes- mo modo e como confirmações de crenças anterior- mente estabelecidas. Nesta casa ocorrem os “eventos primas’, na terminologia de A. Janov (ou antes: não é bem ali que ocorrem objetivamente, mas é ali que o indivíduo sedimenta sua conclusões e, no caso de um evento traumático, é ali que se consolida a reação ao trauma). 20 — Como se faz a transposição desde o nível (er- rôneo em geral) das interpretações correntes em astro- logia, ao nível astrocaracterológico que as repõe na de- vida perspectiva? Suponhamos um horóscopo co Saturno na Casa X, Um astrólogo dirá: trata-se de um indivíduo com sede de poder. Outro: Ele teme as responsabilidades. Outro: Ele tem conflitos com a autoridade. Outro: Ele se preo- cupa com a História e a Política. Astrocaracterologicamnete, a sede de poder está li- gada à Camada 5 (capacidades e forças atualmente co- nhecidas pelo indivíduo); o temor à responsabilidade, á Camada 4 (desejo e, por reverso, temor); os conflitos com a autoridade, à Camada 7 (valores do meio); a pre- ocupação com a Histórica, à Camada 9 (personalidade intelectual). Nada disto pode ser objeto de estudo astro- lógico direto. Assim, toddas essas interpretações podem ser indiferentemente verdadeiras ou falsas, pois o ho- róscopo, em si, nada tem a ver com camada da persona- lidade na qual um traço de caráter há de ressoar; a ca- 60 60 em especial. Os procedimentos da astrocaracterologia são independentes de qual seja a causa do fenômeno astral e, portanto, a astrocaracterologia não entra nesse terreno, no qual se debatem hoje as grandes teorias ex- plicativas de Percy Seymour, Daniel Verney, Jacques Halbronn e tantos outros notáveis investigadores. a as- trocaracterologia adota como sua a divisa de Ortega y Gasset: Que otros hagan su más, que yo hago mi menos. AS CAMADAS DA PERSONALIDADE (texto e comentários orais) 1. Preliminares 1 — “O conceito de personalidade abarca duas idéias diferentes: a da integração mais ou menos perfeira — ela é o conjunto ou o sintema de tudo o que há em mim — e a de individualidade : a forma que em mim assumem os elementos que em mim figuram me pertence propri- amente e me distingue dos outros” (Gaston Berger, Ca- ractére et Personnalité,Paris, Puf, 1954, p.2). 2 — Definições de personalidade: H. Piéron: “A personalidade representa essencialmen- te ... a unidade integrativa de um homem, com todo o conjunto de suas características diferencias permanentes (inteligência, caráter, temperamento, constituição) e suas modalidades próprias de comportamneto “(Vocabulaire de la Psychologie, p. 210). W. Sheldon: “A organização dinâmica dos aspectos cognitivos, efetivos, cognitivos, fisilógicos e morflógi- cos do indivíduo”(cit. por Piéron, id.,ibid.) 3 — Em vista de tais definições, Berger observa que ä psicologia geral isola por abstração um certo número de funções: memória, percepção, imaginação, etc. O estudo da personalidade, ao contrário, uma investigação concreta que se empenha em compreender como todas as funções operam juntas e reagem umas sobre as ouras, 62 62 num homem deternado, ouem tal ou qual categoria de homens”(op.cit.,p.3). 4 — Sendo assim, o estudo da personalidade deve partir das diferentes funções isoladas psicologia geral e reunilas gradativamente em diferentes níveis e camadas — correspondentes aos vários graus de menor a maior integração da personalidade (pois é evidente que o grau de individualidade cresce junto com o de integração, com o que caminhamos dos elementos ao todo, do im- pessoal ao pessoal), destacando, em cada um, os diver- sos esquemas e modalidades da interação dessas finções, cuja totalidade hierarquizada e funcional se chama, pre- cisamente, personalidade. A título provisório, fornecerei aqui uma divisão possível dessas camadas, que deveriam se abarcadas em seu conjunto num estudo descritivo completo de uma personalidade individual qualquer. 5 — O aluno reparará facilmente na disposição zo- dical daste arranjo, mas advirto que isto resulta de uma aplicação casual das categorias zodiacais à descrição de personalidade humana; mas a estrutura do Zodíaco seve aqui como recurso heurístico e mmemônico, e o es- quema duodenário resultante não deve, portanto, ser interpretado precipitamente como uma proposta teóri- ca formal para a descrição dos fatos, empiricamente constatados; seu valor é sugestivo, nada mais. 6 — Destaco, ainda, que cada uma das camadas que assinalo receber particular atenção de determinadas escolas e correntes da psicologia contemporânea, das camadas que assinalo recebeu particular atenção de de- terminadas escolas e correntes da psicologia comtem- porânea, das quais cito algumas entre parênteses, a título de mero exemplo e malgrado as enormes diferenças que as separam umas das outras. Mas esta simples enumera- 65 65 “possessão da mesnte”, até a programação neurolinguís- tica. Estas faixas, porém, nas quais o que o ligam ao ani- mal, à planta, ao mineral e até ao infra-natural estão, por isto mesmo, rigidamente fora do âmbito da caracterolo- gia. 8 — O aluno deve ter notado que as camadas que descrevi podem ser enfocadas quer como uma sucessão de âmbitos que a personalidade, em seu desenvolvimen- to, vai progressivamente abarcando, quer como coecis- tentes num dado momento dessa evolução. 9 — Deve também procurar notar que algumas delas representam momentos e aspectos integrativos, que cristalizam a personalidade num equilíbrio total ao me- nos provisório, ao passo que outras representam divi- sões a rupturas que abrem a personalidade a novos de- senvolvimentos, às vezes por meio de agudas crises; vamos chamá-las, respectivamente, e provisoriamente, de camadas intergrativas (que “fecham”a personalidade num quadro definido) a divisivas que a abrem para o ingresso de influências externas, rompendo o equilibrio anterior e desencadeando a luta por uma nova e superi- or integração. São integrativas as camadas: 1,2,5,6,8,11. São divisivas: 3,4,7,9,10,12. Veremos por que, durante as explicações orais. O estudo dos dois tipos de camadas requer méto- dos opostos. 10 — finalemnte, o aluno deve estar atento para o fa- to de que até a camada 8, todas estão presentes em todo indivíduo adulto normal, ao passo que as seguintes — de 9 a 12 — representam desenvolvimentos que, se numas personalidades se manisfestam plenamente, noutras permanecem em estado germinal ou latente ou são to- talmente sufocadas. A “personalidade”, como se Vê, é um fenômeno que transcende os limites do estritamnete 66 66 “psicológico”- no sentido acadêmico e especializado do termo — e se ramifica na História, an Antropologia, na Religião, etc., cujas contribuições uma psicologia da per- sonalidade deve absorver, sob pena de mutilar seu obje- to. 4. Comentários Por que estamos estudando todas estas caracterolo- gias? Porque o caráter, tal como o entendemos em as- trocaracterologia, é uma região que não é abarcada por nenhuma delas, e, porque o estudo comparado das várias caracterologias deixa, enfim, uma zona em branco, um espaço virgem, que vem a ser justamnete aquilo que se chama caráter me astrocaracterologia. O conceito as- trocaracterológico do caráter está, portanto, sendo aqui exposto gradativamente por suas distinções e contrastes em fase de outros tantos aspectos do caráter estudados pelas várias caracterologias. Com o presente comentário,avançaremos muito na conceituação astrocaracterológica do caráter, e por isto considero esta lição a parte culminante deste primeiro trimestre, e peço aos alunos um estudo cuidadoso deste assunto. Parte I - Preliminares Na definição inicialmente por Berger, destacam-se duas coisas: a integração (a personalidade é um sistema, um organismo, uma ordem uma fórmula) e a individua- 67 67 lidade 9é por essa personalidade que o indivíduo se dis- tingue dos outros) Berger diz ainda que a forma que em mim assumem os elementos que me compõem me per- tence propriamente. Aí, por um lado, subentende-se que os elementos, considerados em si mesmos, podem não me pertencer, podem ser impressoais, podem vir de fora, da família, da sociedade, etc.; porém, por outro lado, também está implícito que a personalidade não se constitui somente da forma, mas da forma com os ele- mentos, ou, melhor ainda, dos elementos na forma. No uso que geralmente se faz do terno em psicologia, a per- sonalidade é um todo indecomnível de elementos e de forma (tal como na definicão aristotélica o homem é um composto inseparável da forma, ou alma, e matéria, ou corpo; e a separação é a morte). Quais são esses elementos a que se refere Berger? São o caráter, as tendências constitucionais, o porte he- reditário, etc. Todos esses elementos, montados numa certa ordem e forma, constituem a personalidade. Se, de um lado, a psicologia geral isola esses elementos e os estuda um a um, a psicologia da personalidade, diz Berger, se definirá como o estudo integrado de todos elementos numa forma em particular, que é a personalidade. Por- tanto, temos aqui duas abordagens complementares: de um lado, os elementos separadas; de outro, os elementos juntados e coeridos pela forma. Mas e a forma enquanto tal? E a forma considerada independentemente dos ele- mentos? Esta não é assundo nem da psicologia geral, nem da psicologia da personalidade. Se quisermos ter uma idéias precisa do que é que vamos chamar de caráter em astrocaracterologia, dire- mos que lee é a forma pura da personalisdade. Ou seja: a forma sem os elementos, a forma como mero esquema 70 70 concede à hipótese astrológica tradicional, portanto, é que a figura do céu em certo momento e lugar, não pre- determinando o nascimento nem o impedindo, limita o quadro dos nascimentos possíveis, no sentido de que, em dado momento e lugar, só poderão nascer pessoas cuja caráter, cuja forma pura de personalidade, seja compatível com a figura com a forma pura da persona- lidade de quem quer que nasça nesse momento e lugar, quaisquer que sejam os elementos que, concreta e empiricamnete, venham a preencher essa estrutura. Por um paralelismo que os alunos versados em simbólica tradicional não terão dificuldade de entender, o caráter, esquema pura da personalidade possível, guarda uma correspond^ncia nítida com a forma total de uma vida realizada e terminada, isto é, com a biografia completa do indivíduo, ainda que ás vezes não se pareça muito com a personalidade real vivente desse indivíduo em cada instante ou fase da sua vida, tomado isoladamente. Dito de outro modo: o indivíduo, enquanto vive, às vezes não se parece muito com seu horóscopo; mas certamnete se paracerá depois de morto, quando`, num retrospecto, enfocarmos a sua biografia como um todo acabado e fechado. O caráter é, de certo modo, anterior e posterior à vida do sujeito real concreto: de um lado é a forma da personalidade possível, portanto do destino possível; de outro lado é a forma do destino realizado e terminado. É só e exclusivamente neste sentido que podemos admitir a validade do velho adágio astrológico de que “caráter é destino”; e nunca no sentido corrente de que o caráter seja a causa eficiente dos eventos que sucedem ao indivíduo; pois os eventos não são senão matéria às vezes casual e adventícia de que se vai compondo o destino; e o que o caráter predetermina é somente a forma total e final desse destino, e não a sucessão de entrada em cena dos elentos materiais, a 71 71 entrada em cena dos elentos materiais, a qual é a rigor, perfeitamente indiferente: com estes ou aqueles ele- mentos, o caráter se realizará. Neste ponto, a astrocaracterologia concorda com Klages quando (nas palavras de seu brilhante intérprete Gustave Thibon) proclama que “a relação meta- empírica da alma ao corpo precede o fato temporal da individuação efetiva; ela está relacionada á essencia e ao fim da pessoa humana... O fundo potencia do caráter resulta da relação transcendental da matéria e da forma”. Porém, a astrocaracterologia inverte a fórmula de Klages, para o qual as constantes do caráter, que “especificam, anteriormente a toda influência e a toda volição consci- ente, nosso comportamento individual, ... representam como que a matéria, mais ou menos plástica ou refratá- ria, sobre a qual se exerce o mundo exterior, de certo modo, à existência temporal concreta, é, para Klages, matéria á qual a influência externa e a vontade livre da- rão forma; para a astrocaracterologia, o caráter é forma e nada mais que forma, pois seria inconcebível uma “matéria” anterior à existência concreta, já que matéria é precisamente o elemento cuja entrada em cena dá exis- tência á forma pura de uma possibilidade, isto é, a uma essência. Tanto a influência externa quando a vontade livre poderão moldar apenas a forma empírica da perso- nalidade, isto é, contribuir para a somatória, acrecentan- do ou subtraindo elementos; mas esta forma empírica não será jamais outra coisa senão uma dentre as várias formas possíveis de um mesmo caráter, uma forma se- lecionada dentro do repertório de possibilidades que é o caráter. E por essas razões que, neste curso, daremos preferência ao estudo de vidas realizadas e terminadas. Isto é, não só vidas terminadas no sentido temporal, mas vidas completadas, no sentido de que o indvíduo se 72 72 completadas, no sentido de que o indvíduo se propôs uma meta, um objetivo, e o realizou, ou ao menos levou sua realização até um ponto identificável. Nocaso de vidas truncadas, frustradas, incompletas, a correspon- dência entre caráter e horóscopo só se manisfesta atra- vés da existência e, quanto mais obscura a existência, mais obscura essa relacão. Muitas pessoas que se debru- çaram sobre o mistério da realização humana, notaram que cada indivíduo, sem conhecer de antemão, é claro, a forma do seu destino, entrevê, no entanto, algo como o nebuloso perfil de um destino possível que lhes parece adeguado e próprio à sua individualidade; apega-se a esta imagem, busca realizá-la; e, entre as vicissitudes da vida às vezes a perde de vista, ou, levado pela franqueza ante as circunstâncias, a esquece quase por completo. Cada ser humano tem a vivência desse “perfil ideal”; e somente aqueles nos quais essa figura se projetou com nitidez nos atos e obras é que se pode dizer terem tido uma vida completa; deles é que se diz terem “realizado o seu arquétipo”(retirando deste terno suas cono- tac’~oes particularmente junguianas). É claro que todas as pessoas têm algum caráter, e que de modo ora mais, ora menos obscuro, ele se manisfetará em algum mo- mento; mas a única marca patente que o caráter pode deixar só se manisfesta em duas coisas: na obra(produtos que subsistem materialmente após o témino da existên- cia) e no personagem (isto é, num modo de ser que, pela intensidade e profundidade da sua ação sobre outras pessoas, deixa lembraças definitivas e indeléveis na his- tória humana). A maior parte das pessoas não realiza obra nenhuma nem deixa marcas de seu personagem, ao menos duráveis e nítidas; a maior parte dos seres faleci- dos nào deixa senão sinais vagos e evanescentes de sua passagem sobre a terra; e por estes sinais, vagos e frag- 75 75 baixo disto, as notas vibradas no céu só ressoam na Terra numa pluralidade indefinida de níveis, devido ao fato de que a maior parte das vidas de homens comuns não che- ga a ter uma forma que reflita o seu caráter. Poderíamos mesmo definir “vida realizada” como aquela cuja forma final copia ou se assemelha à forma do caráter, enquanto as outras vidas, moldadas ao sabor de influências exter- nas e eventos fortuitos, permanece um tanto ao nível do informe, para não dizer disforme. O horóscopo de nascimento pode ser comparado, nesse sentido, a uma partitura de música: somente as execuções felizes e bem realizadas correspondem à partitura original, ponto por ponto; as demais só lhe correspondem de maneira imperfeita e irregular, e em algumas a partitura original se torna totalmente irreco- nhecível. É como se certo indivíduos tivessem uma se- letividade mais ordenada e firme das influências exter- nas, às quais vão dando a forma do seu caráter, enquanto em outros a forma do carátr é obscurecida ou mesmo dissolvida pe;as influências externas. Como já disse, a psicologia geral isola as partes, os aspectos, os vários processos e espécies; a psicologia da personalidade volta a reunir esses vários lementos, mas agora não segundo uma forma lógica abstrata, e sim na forma concreta de uma individualidade humana; a astro- caracterologia, em seguinda, opera uma nova abstração, obtendo a forma pura da individualidade — e é esta forma pura que ela compara ao horóscopo de nascimen- to. É evidentemente que esta operação não se pode rea- lizar serem isolados, — e são justamente estes elemen- tos que são justamente estes elementos que são justa- mente estes elementos que são estudados nas várias ca- racterologias. 76 76 A psicologia da personalidade pode-se dividir em dois aspectos: de um lado, o estudo dos vários processos e níveis pelos quais opera a integração dos elementos; isto seria psicologia geral da personalidade; de outro lado, ele visa essencilamente a tingir uma compreensão da personalidade propriamenteo dita. A diferença entre ela e aastrocaracterologia está na insistência desta últi- ma na forma pura, abstraindo os elementos. Mais tarde isto será esclarecido em detalhes. Mas, só para dar um exemplo. Estudando as obras de grandes romancistas (somente os de vergadura universal, pelas razões já a- pontadas), verifimos que é significativo o número de autores com saturno na Casa III em cujos livros encon- tramos, como tema central e essencial, histórias de ado- lecentes ou jovens que fogem de casa em busca de co- nhecimento ou de aventuras. Ocorrem-me agora o e- xemplos de Dickens, Hermann Hesse e André Gide. São autores enormemente diferentes uns dos outros; suas vidas e suas mentalidades, seus caracteres no sentido de Le Senne (Dickens é um colérico, Gide uma sentimen- tal, Hesse nervoso), as influ6encias literárias e filosófi- cas recebidas, etc. Enfim: isolando todos os elementos que foram compondo suas personalidades, encontramos que não há neles nenhuma razão suficiente para que, em suas obras, um mesmo tema reapareça com constância obsessiva; então, levantamos a hipótese de essa constân- cia reflete uma peculiar inclinação esta que proviria da forma pura do seu caráter, anteriormenteao desenrolar da vida temporal e ao ingresso dos vários elementos em cena; em seguida, verificamos que essa inclinação cor- responde, estatisticamente, à presença de Saturno na Casa III do horóscopo natal. Entre escritores de menor porte — e o escritor de menor é justamente aquele cuja obra reflete menos a sua individualidade criadora a mais 77 77 as influências externas e o gosto da época — não encon- treremos a mesma constância. Do mesmo modo, nin- guém se estende mais na descrição de sensações corpo- rais imediatas do que os escritores que têm Saturno na Casa VI, por exemplo Flaubert, Thomas Mann, Henry Miller). Poderíamos atribuir isto a alguma hipersensibi- lidade proveniente de doença ou nervosismo (isto é, a lementos materiais da personalidade) no caso de Flau- bert, homem de pouca saúde; mas como explicá-la num homem de vitalidade exuberante como Henry Miller? No que diz respeito a elementos de proveniência social, como explicar a presença da mesma inclinação no grande-burguês milionário Thomas Mannn e num filho de modesto alfaiate como Herry Miller? Não, isso não se deve a elementos, mas forma do caráter. É claro que o estudo dos horóscopos de escritores deve obedecer a certos cuidados metodológicos, que só exporei mais tarde e, por isto previno-os de que é inú- til vocês procurarem desde já novos exemplos e cor- respodências desse tipo, movidos por uma natural curi- osidade. Vocês notarão, sem dificuldade, que cada camada seguinte absorve e supera a anterior. Não se deve con- fundir seguinte absorve e supera a anterior. Não se deve confundir a divisão em camadas com a divisão abstrativa em aspectos e funções divrsas; as camadas correspon- dem a uma divisão cronológica ou pelo menos a uma escala de evolução ideal, e cada camada abarca toda a personalidade, concretamente. Digo isto para evitar, desde logo, a pergunta imbecil: “E como se integram depois as camadas que você separou?”. Toda divisão cronológica não separa partes do ser, mas etapas do 80 80 Nesta camada há muitos elementos que, vin- do “de fora”, ingressam na constituição do caráter, favo- recendo ou obstando sua realização. Os que têm prática em astrologia reconhecerão facilmente que certas posi- ções planetárias, no mapa de nascimento, podem ser “leves” para um indivíduo de boa constituição física, “pesadas”para um indivíduo frágil ou doentio; por e- xemplo, Saturno na VI no horóscopode Henry Miller e no de Flaubert. É preciso, no estudo desta camada, conhecer a fundo esses elementos e verificar meticulosamente sua relação com o caráter puro, a qual não é unívoca como em geral pensam os astrólogos. Por exemplo, não se pode saber do estado de saúde de um indivíduo só pelo seu horóscopo, sem outros indícios. A configura- ção astral não resulta me saúde nem em doença senão pela intermediação de outros elementos. Para esclarecer essa complicada dialética entre caráter e hereditariedade, sugerirei mais tarde al- gumas perquisas, que poderão ser realizadas pelos alu- nos. Terceira Camada Todas essas escolas se didicaram a descrever o processo cognitivo, sua evolução e suas várias etapas. É evidente que o preocesso cognitivo é esquematica- menteo mesmo em todos os seres humanos, mas, sendo bastante complexo, ele introduz um elemento de varia- ção no quadro delimitado pela hereditariedade. O que o indivíduo virá a aprender, e como, é algo que depende, em parte, da hereditariedade, em parte, do meio- ambiente, em parte, da lógica inerente ao processo cog- nitivo mesmo, a qual uma coisa totalmente independen- te da hereditariedade individual. As escolas psicológicas 81 81 interesadas na descrição do processo cognitivo fazem geralmente abstração do caráter, da hereditariedade, etc., só se interessando pela cognição enquanto tal. Mas é evidente que uma teoria da cognição não pode substi- tuir uma psicologia geral ou uma pscologia da persona- lidade; ela dever ser integrada nesta últimas, caso quei- ra servir a qualquer objetivo prático. Entendemos, ademais, que, quando o indiví- duo penetra nesta camada, está se introduzindo um ele- mento de liberdade e de indeterminação no quatro an- teriormente é delimitado pela hereditariedade: nem todas as pessoas com as mesma características hereditá- rias recebem as mesmas informações. A história do de- senvolvimento cognitivo do indivíduo deve ser contada independentemente da heretariedade, pois esta não de- termina as opotunidades de aprendizado nem é onipo- tente ao determinar a capacidade de obsorção. Quarta Camada O padrão afetivo do indivíduo tem uma his- tória; ele provém das experiências vividas, que cristali- zam aos poucos determinadas reações, originando o “caráter” tal como o entende Freud, que é como uma resultante da história vivida, que canaliza os impulsos nesta ou naquela direção até consolidar um circuito, são ou neurótico, que tende a repetir-se. Esta história pulsional e afetiva também po- de ser estudada independentemente do caráter, da here- ditariedade eda história cognitiva - mas é evidente que, para conhecermos a personalidade real e integral deve- remos ir aos poucos inserindo cada camada na seguinte, conforme a ordem cronológica de sua entrada em cena. Para entender a contribuição e o valor das escolas que estudaram este tema da história pulsional, é 82 82 preciso inseri-las no quadro de uma ampla psicologia da personalidade, ao invés de querer fazer delas o substitu- to da psicologia toda. Não podemos nos esquecer de que psicaná- lise é uma escola especializada, que enfoca um tema determinado, e que ela não é uma psicologia geral. Tenttivas de fazer dela uma psicologia geral só resultam em ampliar desmedidamente a exibição das suas limita- ções e fraquezas, e expô-la a críticas que, no âmbito do que ela especifica e limitadamente se propõe, seriam injustas. O aspecto particular enfocado pela psicanálise tem um grande valor na determinação do destino; o que devemos fazer é averiguar o peso específico desse fator dentro da concepção geral do homem e da personalida- de Quinta Camada Toda a psicologia de Jung nada mais é do que uma psicologia do ego e da autoconciência; apenas uma resposta à pergunta: “Como me apreendo como indiví- duo auto-consciente e como esta autoconsciência se desenvolve desde as trevas da ignorância até a apreen- são dos arquétipos que determinam sua forma individual e seu destino? “Meu mestre e amigo, Dr. Juan Alfredo César Müller, que estudou com Dra. Maria-Louise von Franz, dizia mais: que toda a obra de Jung era uma longa autobiografia, não um sistema científico-abstrato de psi- cologia. Sexta Camada Pode-se distinguir entre aptidões, que seriam mais ou menos inatas, e capacidades, que seriam mais ou menos adquiridas. No entanto, não faz sentido estu- darmos esta questão antes de termos uma visão suficien- te da psicologia do ego, pois aptidão é o domínio cons- 85 85 poderíamos julgar moralmente nossos atos? Abaixo de um certo nível de integração da personalidade que per- mita a eclosão desta personalidade intelectual superior, a rigor podemos dizer que os atos do sujeito são mo- ralmente irrelevantes (isto no sentido da moral pura, Kantiana, não da moral social, pois seus atos têm influ- ência sobre os outros). O problema moral de que fala- mos surge quando, concebendo que existem valores u- niversais dentro de si, que lhe cabe realizar, o indivíduo se recusa a fazê-lo. Mas como exigir isto daquela que não tem uma síntese individual formada, de um indiví- duo que ainda está dissolvido dentro da mentalidade coletiva, e que, quando erra, junto com os outros? Décima Primeira Camada Na medida em que tenha uma personalidade intelectual superior e um transcendental, capaz de se sobrepor a toda sua existências e julgá-lo, no momento em que alcança este ponto, de poder julgar sua existên- cia e seus atos como se estivesse acima de si, é que o sujeito presta satisfação de si perante o tribunal da hu- manidade, da História. Décima Segunda Camada Esta psicologias tratam fundamentalmente do sentido da vida do indivíduo, do indivíduo perante sua responsabilidade moral última, algo que está acima do personagem, algo que a humanidade mesma não sabe. É fundamentalmente, o indivíduo como Homem Uni- versal, como Cristo, como pastor e resposável pela hunmanidade inteira. 86 86 O ENFOQUE BIOGRÁFICO Biografia e Destinologia É evidentemente impossível pronunciar qualquer julgamento, que se pretenda científico ou ao menos intelectualmente relevante, sobre um ato, episó- dio, um traço de caráter, ou uma qualidade de um ho- emm, sem tomar como pano-de-fundos e pressuposto, implícito ou explícito, consciente ou inconsciente, pa- tente ou inconfessado, um quadro de valores e critérios, uma visão geral da vida e do destino humanos, uma an- tropologia filosófica qualquer, ou, para resumir, uma antropovisão. Por trás de qualquer jilgamento particular, por trás mesmo da simples constatação de “fatos, exis- tem sempre princípios gerais que delimitam, enqua- dram, esquematizam e mesmo determinam nossa visão e nossa avalição das coisas, seres e situações. Nem sempre estamos conscientes desses princípios, que muitas vezes absorvemos passivamente das crenças e hábitos do meio-ambiente, e que passamos a aplicar sem nenhum exame crítico. Nas épocas de forte consenso coletivo quan- to aos valores e metas da vida humana, esse automatis- mo no julgamento dos casos individuais não chega a ser danoso, porque o hábito de julgar sempre com base nos 87 87 mesmos princípios - por errôneos ou estreitos que se- jam em si - faz com que as pessoas, com tempo, desen- volvam uma habilidade, uma espécie de sabedoria práti- ca, que as ajuda a avaliar corretamente as situações con- cretas, compensando a estreiteza dos princípios. Porém, nas épocas de mundança acelerada de valores e critérios, não pode mais o homem apoiar-se no automatismo, sem risco de erro. Pois os consensos em que crê apoiar-se são limitados no tempo, isto é, destinados a perecer cedo ou tarde sob o impacto da crítica, ou limitados no espaço, isto é, restritos a deter- minados grupos sociais, cuja voz não teria por que des- frutar de autoridade sobre a sociedade como um conjun- to. Aí não resta ao homem honesto outra alternativa senão entrega-se ao laborioso esforço de examinar cri- timente is pressupostos de seus julgamentos, até poder chegar a um critério maduro e, tanto quanto possível, independente. É numa situação assim que nos encontra- mos. A necessidade desse exame é tanto maior para as pessoas as que estejam profissionalmente, ou por hábito intelectual, envolvidas na compreensão e avalição de atos humanos; refiro-me particuamente aos psicólogos, juristas, médicos, sociólogos, assistentes sociais, pedagogos, etc., Os astrológos não teriam como deixar de incluir-se nesse grupo, dada, sobretudo, a cres- cente impotância social do seu ofício. No entanto, tenho constatado que os maioria quadros criteriológicos em que a maioria dos astrólogos de hoje apóia suas análises e interpretações se constitui frequentemente de um amálagama improvisado e gros- 90 90 cias tenha, ao longo dos séculos, se rebaixado ao zelo idiota de padrecos que fiscalizam meninos para que não se masturbem, e, a meu ver, somente mais um sinal de quanto o diabo tem sido bem sucedido na sua empresa de reduzir ao ridículo a inteligência humana. Para que se perceba o quanto é grotesca e aber- rante a doutrina do meterialismo espiritual, basta notar que ela implica serem as pedras, por mais densas, espi- tualmente inferiores à energia elétrica, e esta, por sua vez, muito menos santa do que a sutilíssima energia a- tômica. Por essa teoria, a bomba que “sutilizou”os muros de Hiroxima e Nagasaki foi um esplêndido benefício espiritual para a humanidade. É claro que essa é uma doutrina que só serve para indivíduos intelectualmente lesados, incapazes de apreender o que quer que seja do reino do espírito, que é o reino da verdade, da universalidade e da liberdade, e que nada tem a ver com energias, sutis ou grossas, nem com falta delas, assim como a forma pura do círculo não tem nada ver com o papelão, a madeira, o metal ou qualquer matéria, grosseira ou fina, em que o recorte- mos. Não se pode atingir o espírito por sutilização da matéria, tal como não se pode alcançar o infinito pela soma de quantidades indefinidas, por maiores que sejam. 2º - A referida interpretação pressupõe ainda que o cosmo físico tenha sido propositaldamente construí- do de modo a fovoreza estaria, assim, repleta de lições quanto ao certo e ao errado nos comportamentos hu- manos, faltando apenas, para cada evento natural, extrair a respectiva moral da história. É o que eu chamo mora- lismo cósmico. 91 91 Essa ideologia enfatiza a continuidade - para não dizer a indentidade - entre o mundo da necessidade físi- ca ou natural e a esfera da liberdade moral humana. Não enxergar a menor diferença entre o fenômeno da influ- ência astral em si mesmo, fisicamente ou energetica- mente considerado, e o significado que possa ter para este ou aquele indivíduo em particular ou para este ou aquele grupo social. Lê nos eventos cósmicos uma inte- cionalidade psicopedagógica literal e direta; e, quando, ao fazê-lo, professa estar usando de “interpretações sim- bólicas” ou analógicas, demonstra apenas não saber o que é a linguagem dos símbolos, pois esta, sempre vari- ávele dúplice por natureza, é incapaz de fazer por si mesma qualquer advertência ou recomentação, sem o auxílio de um quadro axiológico previamente dado, que possa aferir o valor moral e prático das significações apontadas. Ao misturar numa pasta confusa o mundo da na- tureza e o mundo moral humano - sem ter em conta as múltiplas transições dialéticas que intermedeiam o seu relacionamento -, essa doutrina, se assim cabe chamá-la, omite a distinção entre causalidade e significação, que se tornou clássica nas ciências humanas desde Weber. O resultado prático desta omissão é que o indivíduo, o cliente, é implicitamente convidado a abdicar da liber- dade de sua conciência moral, isto é, da capacidade de escolha racional dos fins, para deixar a condução de seus atos à mercê do arbítrio do cosmos físico, doravan- te incumbido de nos ditar os comportamentos a adotat ou a evitar em cada situação. Acreditando elevar-se a uma “consciência cósmica” superior, tudo o que o indi- víduo consegue é amortecer a única conciência de que 92 92 efetivemente dispõe, para tornar-se daí por diante um mero sensor de sinais e presságios. Retorna assim à mais grosseira e arcaica superstição dos augúrios naturais, que acaba por substituir a consciência moral racional em dissolução. A doutrina do moralismo cósmico surgiu como uma reação, até certo ponto cabível e justa, contra o pendor da astrologia clássica de rotular como benéficos ou maléficos os planetas e aspectos planetários, sem qualquer contrapeso dialético. Ocorre apenas que a as- trologia clássica fazia tais julgamentos apenas desde um ponto de vista dos fins práticos mais óbvios da ação humana individual, vendo um bem naquilo que a ajudava e um mal no que lhe oferecia obstáculo, no mesmíssimo sentido em que na vida diária acreditamos topar com oportunidades e impedimentos, sem que isso implicasse louvor ou censura moral aos astros, aos aspectos celes- tes ou muito menos ao cosmos, como um todo. Ao con- trário: basta notar o quanto a cosmovisão dos astrólogos e pensaodres astrológicos de antigamente era dependen- te das concepções religiosas - grego - romanas, cristãs, judaicas ou islâmicas - para perceber que eles simples- mente não poderiam sequer chegar a conceber que uma força natural qualquer fosse por si algo de intrinseca- mente maléfico ou benéfico, pois, segundo todas essas concepções religiosas, o mal e o bem só podem existir como tais na esfera da liberdade moral, estando, por definição, excluídos do reino da necessidade natural. Quando, portanto, Ptolomeu ou Bonatti ou Ibn `Arabi ou Morin de Villefranche ou Fludd falavam do malefí- cio ou benefício dos planetas, se referiam exclusiva- mente aos afeitos coadjuvantes ou impeditivos que e- xerciam sobre os fins e atos humanos, que, estes sim, 95 95 independentemente dos fatos naturais e simbólicos con- siderados, o que não poderia jamais ser deles deduzido. Em terceiro e mais grave lugar, ao introduzir no estudo do fenômeno astral considerações morais abso- lutamente extemporâneas, a astrologia abandona o seu campo legítimo e específico para arrogar-se a posição de uma superciência que seria ao mesmo tempo metafí- sica, ética, pedagogia, psicologia, medicina e jurispru- dência. É tão habitual entre os astrólogos, hoje, encara- rem sua cuência como uma espécie de sabedoria uni- versal, e não como uma ciência especilizada e limitada, que não percebem que não há mais razões para dedu- zirmos consequências éticas do fenômeno astral do que as há para deduzi-las dos fatos biológicos ou químicos. Afinal, se tudo é símbolo, se a natureza fala, não há por que privilegiar os astros em vez das amebas, infusórios, sulfetos e nitratos. A diferença é que os biólogos e quí- micos têm um pouco mais de compostura. A inflação do campo da astrologia, no entanto, tem explicação: é um caso clássico de compensação, no sentido adleriano. Qaunto menos seguro o astrólogo se sente do seu saber, no campo rigoroso dos fatos e das leis científicas, mais tende a enfatuar-se em generalizações pseudofilosóficas destinadas s spsziguar a dolorosa consciência da vacui- dade do seu saber. Todo e qualquer estudo da natureza pode levar a conclusões filosóficas ou éticas de grande valor, mas que diríamos de um biólogo que, pouco ou nada saben- do de certo acerca da biologia, estendesse seu campo de investigação tão-somente essas conclusões, abandonan- do ou desleixando o campo específico do estudo bioló- 96 96 gico? Teria deixando de ser biólogo, sem conseguir tor- nar-se mais que um pseudofilósofo. A astrologia, nesse sentido, não é nem pode ser uma sabedoria mais do que o são ou podem ser a física ou a mineralogia. Uma ciência deve, antes de tudo, bus- car as leis que governam os fatos, ao invés de, partindo de fatos mal observados e pior explicados, pretender ver neles “intenções”ou “significados” misteriosos e su- tis. Uma astrologia sapiencial só é legítima na medida em que não pretenda sorrateiramente ocupa o lugar da ciências astrológica faltante. Foi isto que, já num curso dado em 1986, proclamei ao dizer que, se a astrologia pretende chegar ao significado espiritual de fenômenos naturais, então a astrologia natural deve preceder neces- sariamente astrologia espiritual, a qual, sem ela, é oco figimento. Muito bem. Estamos aqui reunidos, nesta sexta rodada de aulas do Curso de Astrocaractelogia, para en- trar agora no estudo da biografia, o desenho da vida hu- mana. O caráter, como foi dito, é o fundo fixo de uma vida que é incessante mudança. Para encontrá-la, deve- mos coar a biografia, a narrativa das mudança, até que se deposite no fundo da peneira o resíduo fixo. Não é só por isto que o estudo da biografia nos importa. Em toda atividade psicológica, ou em qualquer dos campos com que a astrologia faz parede-meia, o que o profissional tem diante de si é uma vida humana; uma vida, não em sentido biológico, mas em sentido biográ- fico, existencial. Uma vida feita de esperanças, de atos, de derrotas e vitórias, uma vida., enfim, que só se com- preende ao contá-la. Devemos, pois, preparar-nos no 97 97 estudo desta forma especial de conhecimento que é a narrativa. Conheço um indivíduo, no sentido existencial, quando ele me conta a sua vida, quando assisto ao seu desenrolar, quanto, em suma, sei narrá-la. A narrativa de uma vida pressupõe uma seleção e ordenação das partes e episódios, de modo que a massa confusa confusa adquira um perfil, uma forma narrável. Esta seleção e ordenação, precisamente, requer o con- curso de um critário, de um esquema de avaliação, ou seja, daquilo que denominei antropovisão, ou, se quise- rem, antropologia filosófica. Vimos, nos parágrafos anteriores, como a antropovisão corrente entre os astrólogos é defeituosa e insuficiente; vimos como, por ela, pouco podemos compreender realmente da vida individual humana - seja da vida de grandes personagens, seja da vida do mais humilde de nossos clientes. Redigi estas páginas pensando que o estudo da an- tropovisão, como critério do estudo biográfico, requeresse tais paravras de advertência. O que vamos fazer em seguida é um empreendi- mento da mais alta significação não só para a formação intelectual e profissional dos alunos, mas para a avalia- ção da vida e dos valores de cada qual, pois é só com- preendendo-nos a nós mesmo que chegamos a poder compreender os demais seres humanos, é contando a nossa vida que aprenderemos a contar a alheia. Este ponto do nosso curso requerer ádos alunos um extremo esforço de veracidade, de objetividade, de fidelidade à própria consciência. Ele será um mata-burros onde sem