Baixe Técnicas de Análise de Amostras Ambientais e outras Transcrições em PDF para Química Analítica, somente na Docsity! Técnicas de Preparo de Amostras Extração com Solventes* Resumo O objetivo de uma análise química é a obtenção de dados qualitativos e/ou quantitativos a respeito de um ou mais componentes de uma amostra. Quando a técnica analítica escolhida é a cromatografia, o procedimento analítico pode ser usualmente dividido em 3 etapas principais: pré-‐cromatográfica, cromatográfica e pós-‐cromatográfica. A etapa pré-‐cromatográfica envolve a amostragem, o transporte da amostra até o laboratório onde sera efetuada a análise, e a etapa de preparo da amostra. Técnicas como LLE, SPE, SFE, ASE, SPME, dentre outras, são empregadas nesta etapa. A etapa cromatográfica visa a separação do analito de seus principais contaminantes, gerando os dados necessários para a identificação e/ou quantificação. Técnicas como HPLC-‐UV, GC-‐ECD, LC/MS/MS, GC/MS e outras são frequentemente empregadas. A etapa pós-‐cromatográfica visa tratar os dados qualitativos e quantitativos obtidos. No presente artigo, uma revisão crítica a respeito destas 3 etapas envolvidas em uma análise cromatográfica incluindo os fundamentos teóricos, a instrumentação, vantagens e limitações, e aplicações das principais técnicas, é apresentada e discutida criticamente, do ponto de vista do autor. _____________________________________________________________________________________________ * Fonte: Fernando M. Lanças, “Avanços Recentes e Tendências Futuras das Técnicas de Separação: uma visão pessoal”. Scientia Chromatographica vol. 0 número 0, pag 17-‐44 (2008). 1. Introdução A segunda metade do século XX observou um avanço sem precedentes nas técnicas de separação, devido aos novos desafios gerados pelo aumento da população mundial e a demanda por serviços a partir do incremento tecnológico marcante do período Pós-‐Guerra. Contrariamente às exigências anteriores a este período, quase sempre razoavelmente atendidas por métodos físicos simples de análise como, por exemplo, gravimetria, a complexidade dos problemas ambientais, de saúde, alimentação, energia, e muitos outros, passou a exigir técnicas de análise mais complexas. Esta necessidade trouxe a exigência de técnicas mais rápidas, eficientes e, principalmente, capazes de serem automatizadas através de instrumentos complexos indisponíveis até a década de 1950. A popularização dos computadores, graças aos preços tornados mais accessíveis, possibilitou o desenvolvimento de equipamentos totalmente comandados por um computador pessoal de grande capacidade de processar dados e armazená-‐los, a um custo o qual é hoje apenas uma pequena fração do custo da maioria dos equipamentos que ele comanda. A complexidade analítica não é reservada apenas à área de instrumentação: métodos mais elaborados (muitas vezes mais de um método usado para a mesma análise) tem que ser desenvolvidos e ou adaptados a esta nova realidade, além de passarem por etapas extensas de validação antes do uso para que os dados sejam reconhecidos pelas agencias governamentais as quais regulamentam a aceitação de resultados de análises químicas. No caso particular de métodos analíticos para emprego na área de Saúde Humana, as exigências quanto à validação das metodologias são enormes, variando de um país para outro e, muitas vezes, de um órgão para outro dentro do mesmo país. Na análise de compostos-‐alvo (target compounds) presentes em matrizes consideradas complexas, como alimentos, ambientais, e fluidos biológicos, regra geral o objetivo é analisar um ou alguns compostos em uma matriz na qual está presente em concentrações muito baixas (geralmente referida como análise de traços). Nestes casos, usualmente é necessário, empregar uma série de etapas, incluindo: extração do analito da amostra, sua purificação para eliminação de potenciais contaminantes e interferentes, os quais podem comprometer o resultado Neste volume inaugural do periódico Scientia Chromatographica, cujo objetivo é exatamente discutir estas técnicas de preparo de amostra, separação (LC, GC, SFC e outras) e identificação (Espectrometria de Massas, dentre outras), este trabalho visa apresentar, de forma crítica e atual, segundo o ponto de vista do autor, os recentes avanços na área e as tendências futuras. Esses assuntos serão ampliados e discutidos em detalhes nos futuros volumes do periódico em questão, através das várias sessões dedicadas às etapas pré-‐cromatográficas, diferentes técnicas de separação e etapas pós-‐cromatografia. 2. Técnicas de Amostragem A amostragem é, invariavelmente, considerada uma das etapas mais críticas do procedimento analítico, uma vez que a seleção incorreta do material a ser analisado inviabiliza qualquer tentativa de correção posterior do problema2. Deve ser lembrado que a amostragem visa o isolamento de uma quantidade muito pequena de uma amostra a qual faz parte de um universo muito maior (exemplo: alguns litros de água para representar a condição de um rio inteiro!!!). Neste caso, o material orgânico presente na água varia de ponto a ponto tanto na extenção quanto na profundidade, dificultando sobremaneira o projeto de amostragem. Além disso, pelo fato do rio ser um sistema dinâmico e não estático, o momento da amostragem também é importante, o que requer o registro também do momento da amostragem para futuras correlações. De forma análoga, a amostragem de sedimentos de rio é uma etapa igualmente complexa e difícil, ampliada pelo fato de poucos guias internacionais a este respeito (diferentemente de água e solo). Apesar dos esforços da Comunidade Européia em normatizar as técnicas de amostragem de solo, pouco avanço foi atingido na prática 3-‐5. Independentemente da matriz, e das substâncias de interesse, a análise de matrizes complexas – especialmente as de alimentos, ambiental, e fluidos biológicos – deve ser precedida de um plano de amostragem, preferencialmente validado. O planejamento, execução, interpretação de resultados, e redação dos relatórios de análise deverão estar dentro de um sistema de qualidade compatível com sua finalidade 6. 3. Técnicas de Preparo de Amostras Após a etapa de amostragem, a parte isolada a qual agora deveria ser denominada sub-‐amostra mas que, na prática, continua sendo denominada amostra, deveria idealmente ir diretamente para a análise instrumental, o que raramente é feito. Isso deve-‐se ao fato de que em geral o produto da amostragem contém contaminantes próprios da matriz, além de outros agregados durante o processo ou transporte (por exemplo, é comum recebermos no laboratório amostras de batata, para análise de resíduos de pesticidas, contendo terra). A sub-‐amostra, contendo os compostos de interesse e os contaminantes, e doravante denominada amostra por simplicidade e por refletir a nomenclatura efetivamente utilizada nos laboratórios de análise, deverá então ser transformada para outra forma mais apropriada para a análise. No caso de análise de fármacos em fluidos biológicos, por exemplo, a presença de proteínas e outras macromoléculas, assim como de outras substâncias menores, pode interferir,de diferentes maneiras, na análise. Deve ser lembrado que estas matrizes contem centenas de compostos químicos, a maioria em concentração superior à do fármaco, o que dificulta ainda mais sua determinação qualitativa e quantitativa. Muitas vezes existe ainda a necessidade de converter-‐se uma substância da forma na qual se encontra para outra mais amena para a análise (devido a problemas de estabilidade térmica, falta de volatilidade, ausência de grupos funcionais adequados para detecção espectroscópica e outras), através de procedimentos de derivatização. Este conjunto de ações, usualmente denominado genericamente de preparo de amostras, envolve diversas etapas no laboratório, das quais a mais importante e complexa é, sem dúvida, a etapa de extração. Em muitos casos atualmente, a etapa de extração pode ser combinada com a concentração dos analitos, derivatização e outros procedimentos, em uma única etapa para o preparo da amostra. Existem várias técnicas de extração, dependendo do estado físico, químico e a complexidade da amostra e dos compostos a serem extraídos, sendo as principais discutidas a seguir. 3.1. Extração Líquido-‐Líquido (LLE) Na extração líquido-‐líquido (LLE, “liquid-‐liquid extraction”) duas fases imiscíveis são empregadas: uma fase A, a qual contém o solute de interesse X, e uma fase B a qual será colocada em contacto com ela. Desta forma, ocorrerá uma distribuição do soluto X entre as duas fases, após o que o componente X poderá ser submetido a outro processo de extração ou encaminhado para a análise por HPLC. De acordo com a teoria geral do equilíbrio químico, para um processo reversível A constante de equilíbrio pode ser expressa pela lei de distribuição de Nernst como onde KD é a constante de equilíbrio, [X]B a concentração de X na fase B (numerador da expressão), e [X]A a concentração de X na fase A. A situação experimental ideal seria aquela na qual o equilíbrio fosse altamente favorecido no sentido da transferência de X para a fase B, ou seja, que o valor de KD fosse elevado. Valores pequenos de KD indicam que o processo é desfavorecido e que a transferência de X para a fase B ocorrerá em pequena extensão. Esta equação possui 3 restrições principais, as quais são usualmente observadas para extração de solutos a serem analisados por LC: (1) a concentração de X deve ser bastante baixa em A e em B; (2) a forma molecular de X deve ser a mesma nas duas fases; (3) as duas fases devem ser imiscíveis. Dependendo da forma com a qual as duas fases são colocadas em contacto, três modos principais de extração são possíveis: batelada, contínua, e em contra-‐corrente. O processo é então repetido. A Figura 2b ilustra extrator empregado quando o solvente de extração é mais denso do que a solução que contém a amostra. O solvente extrator é colocado no frasco de destilação (A) e aquecido; os vapores passam para a parte superior do tubo diretamente na superfície da solução a ser extraída (D) e, por serem mais densas, as gotículas atravessam a solução até o fundo, extraindo à medida em que descem. A pressão hidrostática forçará o extratante através do braço lateral (E) e de volta para o frasco de destilação. O processo é então repetido até que todo o soluto de interesse tenha sido removido. Processos de extração contínua são, usualmente, bastante demorados (horas até dias). A vantagem desta técnica é que solutos com valores de KD pequenos, os quais dificilmente seriam extraídos por processos de batelada, podem ser removidos da amostra através de uma extração contínua. 3.2. Extração Líquido-‐Sólido Existem várias técnicas analíticas empregadas na extração dos compostos de interesse em matrizes sólidas e semi-‐sólidas, desde simples e baratas (porém com vários inconvenientes) como a extração com solvente sob agitação, até bastante sofisticadas como as técnicas que empregam solventes pressurizados. Na prática atual, as técnicas mais empregadas para este tipo de amostra empregam solventes líquidos ou um fluido pressurizado (SFE, ASE, SWE e outras). Dentre as técnicas que empregam solventes líquidos a Extração Soxhlet (Sox) e a Extração em Fase Sólida (SPE) são as mais utilizadas. 3.2.1. Extração Soxhlet A Extração Soxhlet, ou alguma de suas variações, foi uma das técnicas de extração mais empregadas para amostras sólidas na segunda metade do século XX. O equipamento utilizado nesta técnica é relativamente simples (Figura 3), o que auxiliou na sua popularização. O sólido a ser extraído é, geralmente, pulverizado e colocado em um cartucho feito de papel de filtro ou de algodão (E), no centro da câmara (A). Figura 3. Extrator Soxhlet. O solvente extrator é aquecido no frasco (B) e os seus vapores sobem através do braço lateral (C) até o condensador (D) onde é liquefeito. O líquido permanece nesta câmara aumentando de volume e extraindo o sólido até que o nível de líquido atinja o topo do braço lateral (F). Neste ponto, a pressão hidrostática dentro da câmara faz com que o solvente seja sifonado de volta ao frasco de destilação. Este processo continua até que todo o soluto tenha sido removido do sólido. Trata-‐se, portanto, de uma extração contínua do tipo líquido-‐sólido. A principal limitação desta técnica é o tempo necessário para obter se um bom rendimento de extração, usualmente variando desde muitas horas até dias, o que tem feito com que novas técnicas mais rápidas e automatizadas venham sendo desenvolvidas com a intenção de substituí-‐la. Em meados da década de 1970, uma nova técnica foi introduzida, visando solucionar as principais limitações da Extração com Solventes, havendo sido denominada Extração em Fase Sólida, SFE (“Solid Phase Extraction”), a qual será descrita em outras partes do presente trabalho. Referencias Bibliográficas 1. Lanças, F.M., J.Braz. Chem. Soc. 14,183(2003). 2. Poole, C. F.; Poole, S. K.; Chromatography Today, Elsevier: Amsterdam, 1995. 3. Sastre, J.; Vidal, M.; Rauret, G.; Sauras, T.; Sci. Total Environ. 2001, 264, 141. 4. Muntau, H.; Rehnert, A., Desaules, A.; Wagner, G., Theocharopoulos, S.; Quevaullier, Ph.; Sci. Total Environ. 2001, 264, 27. 5. Theocharopoulos, S.; Wagner, G.; Sprengart, J.; Mohr, M., -‐E.; Desaules, A.; Muntau, H.; Christou, M.; Quevaullier, P.; Sci. Total Environ. 2001, 264, 51. 6. Rosiane Nickel DVGQB – LACEN/PRSistema de Gestão da Qualidade nos laboratórios Clínicos-‐Documentação da Qualidade. http://www.lacen.saude.pr.gov.br/arquivos/File/SESLAB/Doc_Qual.pdf 7. Miyaguchi H, Tokeshi M, Kikutani Y, Hibara A, Inoue H, Kitamori T, J. Chromatogr. A 1129, 105 (2006). 8. Ooe K et. Alii., J. Nucl. Radiochem. Sci. 8,59 (2007). 9. Cai ZX, Fang Q, Chen HW, Fang ZL, Anal. Chim. Acta 18, 556 (2006). 10. Okuko Y. et alii, Chem. Eng. Sci. 63, 4070 (2008). 11. Lanças, F.M., “Extração em Fase Sólida”, Ed. Rima, 2005.