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Guias e Dicas
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Senhorio poder senhorial, Manuais, Projetos, Pesquisas de História Medieval

Como o poder de exercer a justiça era utilizado na Idade Média

Tipologia: Manuais, Projetos, Pesquisas

2021

Compartilhado em 01/05/2021

Almir-marques
Almir-marques 🇧🇷

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Baixe Senhorio poder senhorial e outras Manuais, Projetos, Pesquisas em PDF para História Medieval, somente na Docsity! P á g i n a | 97 Fronteiras & Debates Macapá, v. 4, n. 2, jul./dez. 2017 ISSN 2446-8215 https://periodicos.unifap.br/index.php/fronteiras Senhorio, poder senhorial e exercício da justiça nos Costumes de Beauvaisis Ana Catarina Zema de Resende* Resumo: O estudo dos direitos de justiça e de polícia na obra de Philippe de Beauma- noir, Costumes de Beauvaisis, foi conduzido a partir do exame dos conceitos de senho- rio e de poder senhorial, conceitos fundamentais para compreensão das relações de poder no período medieval. Sob o ângulo da antropologia jurídica, pretendeu-se anali- sar os direitos de justiça e de polícia dos senhores feudais como estabelecidos nos Cos- tumes de Beauvaisis, para mostrar que no século XIII, quando os conflitos entre senho- res cessam, o que passa a ter importância para a afirmação do poder do senhor é o exercício de justiça. Após breve apresentação do autor e da fonte, expõe-se, em um primeiro momento, apontamentos historiográficos sobre a temática do senhorio e do poder senhorial para, em seguida, analisar nos Costumes de Beauvaisis os direitos de justiça e de polícia que são aqueles que dão ao senhor o poder de julgar, de punir, de cobrar taxas e multas e de afirmar seu poder de ban. Finalmente, conclui-se que o exercício da justiça está na base de todos os outros direitos e que é graças ao seu direi- to de justiça que o senhor vai adquirir o poder necessário para exigir de todos seus súditos os outros direitos. Palavras-chave: Senhorio. Justiça. Philippe de Beaumanoir. Seigniorial System, Seigniorial Power and the Exercise of Justice in the Customs of Beauvaisis Abstract: The study of the rights of justice and police in the work of Philippe de Beaumanoir, Customs of Beauvaisis, was conducted considering the concepts of sei- gniorial system and seigniorial power, which are fundamental for understanding the relations of power in the medieval period. From the perspective of law anthropology, the rights of justice and police of the feudal lords, as established in the Customs of Beauvaisis, was analyzed to show that in the thirteenth century, when conflicts be- tween masters cease, the exercise of justice became important for the affirmation of the power of the lord. After a brief presentation of the author and the source, historiographic notes on the subject of the seigniorial system and the seigniorial power are presented and the rights of justice and police in the Customs of Beauvaisis are ana- lyzed. These rights are the ones that give the Lord the power to judge, to punish, to charge fees and fines and to assert their power to ban. Finally, it is concluded that the exercise of justice is the basis of all other rights and that due to his right to justice, the Lord gains the necessary power to demand the other rights from all their subjects. Keywords: Seigniorial System. Justice. Philippe of Beaumanoir. Introdução O século XIII, como sustentou Jacques Le Goff, representa o apogeu, o zênite, o * Pesquisadora do Grupo de Estudos em Direitos Étnicos Moitará da Faculdade de Direito da Universidade de Brasília. Doutora em História Social pela Universidade de Brasília. DOI: 10.18468/fronteiras.2017v4n2.p97-118 P á g i n a | 98 Fronteiras & Debates Macapá, v. 4, n. 2, jul./dez. 2017 ISSN 2446-8215 https://periodicos.unifap.br/index.php/fronteiras pico da Idade Média. Ele marca a última fase de um período que vai dos arredores do ano 1000 ao começo do século XIV, um período de prosperidade, de crescimento po- pulacional, de expansão das culturas, quando as terras se tornam mais férteis, quando acontece um revigoramento urbano e comercial, quando aparece a máquina, quando se difunde a moeda, quando “escolas e universidades são fundadas, a arte romano- gótica desabrocha, as mentalidades afinam-se, os sentimentos interiorizam-se, um humanismo cristão multiforme retorna às fontes do cristianismo, desenvolve-o e aper- feiçoa-o.” (Le Goff, 1982, p. 8). Época de muitos feitos notáveis sem dúvida, mas que conheceu a Inquisição, a intolerância e a violência. Foi uma época marcada pela importância e pela abundância dos conflitos jurídicos, quando justiças e tribunais franceses começaram a se consoli- dar. O século XIII foi também um período marcado pela sede da expressão escrita. Co- letividades, principalmente as urbanas, reclamavam a fixação das normas cujo caráter flutuante havia levado a tantos abusos. Escritores sem missão oficial e simplesmente para a comodidade dos praticiens (operadores do direito) se dedicavam a colocar por escrito os costumes e as normas jurídicas em vigor entre eles. Foi a época do renasci- mento do direito romano e, com ele, de uma técnica jurídica. Nesse contexto, insere-se a obra Costumes de Beauvaisis de Philippe de Beau- manoir.1 E para realçar sua importância e o significado desse tipo de testemunho, lembramos aqui as palavras de Marc Bloch quando chamou atenção para o fato de que nenhum historiador do feudalismo poderia renunciar “ao socorro do mais admirável analista da sociedade medieval, o cavaleiro, poeta e neto de São Luís, o autor em 1283 dos Costumes de Beauvaisis: Philippe de Beaumanoir” (1994, p. 179). De fato, trata-se de uma fonte importante para se entender melhor a socieda- de do norte da França no século XIII. Por ser um tratado de direito, é uma fonte que documenta com precisão as regras fixadas pelos costumes que diziam respeitos aos direitos e obrigações dos senhores feudais, vassalos, homens livres e servos, particu- 1 A obra Costumes de Beauvaisis usada aqui é a edição de Am. Salmon publicada pelas Edições A. e J. Picard no ano de 1970. Trata-se de uma reimpressão da edição original (primeira publicação de Am. Salmon) de 1899. Essa reimpressão é o resultado de um estudo feito sobre as cópias da obra de Phi- lippe de Beaumanoir que chegaram até nós. Ao total são treze cópias se contadas as que foram feitas no século XVII a partir de manuscritos conservados. De acordo com a edição de Salmon, a obra é divi- dida em setenta capítulos. Cada capítulo é constituído de vários parágrafos, perfazendo no total, os dois primeiros volumes juntos, 1982 parágrafos. P á g i n a | 101 Fronteiras & Debates Macapá, v. 4, n. 2, jul./dez. 2017 ISSN 2446-8215 https://periodicos.unifap.br/index.php/fronteiras quando define o conteúdo de seus direitos e como esses direitos expressam as rela- ções de poder em jogo na dinâmica social. Sobre a obra e o autor A obra Costumes de Beauvaisis2 é um tratado de direito consuetudinário do sé- culo XIII que tornou célebre o nome de Philippe de Beaumanoir. Esse livro constitui uma das grandes obras do século XIII, sendo qualificado por muitos historiadores - principalmente os que se ocupam do direito e das instituições, como Jacques Ellul (2013), François Olivier-Martin (1992), Jean-François Lemarignier (1970) e G. Lepointe (1937) - como a compilação mais completa, mais bem redigida e mais representativa do direito consuetudinário do século XIII. Para fazer essas afirmações, esses historiado- res se basearam na comparação deste coutumier com os outros coutumiers da mesma época: Les établissements de Saint Louis, Conseil à un ami, Le livre de la jostice et de plet e Grand coutumier de Normandie, chegando ao consenso que o coutumier funda- mental é o de Philippe de Beaumanoir. Beaumanoir nasceu em Lorris, depois do ano de 1247. Viveu durante os reina- dos de São Luís, Filipe II, o Audaz, e veio a falecer em 1296, durante o reinado de Filipe, o Belo. Ele teria escrito dois grandes romances: Manekine e Jehan de Dammartin et Blonde d’Oxford, além de muitos poemas que, segundo especialistas são repletos de graça, calor e de desembaraço na expressão escrita. Philippe de Beaumanoir é o se- gundo filho de um nobre, cavaleiro e bailio3 de Gâtinais e de Artois, Philippe de Rémi. Beaumanoir serviu ao Conde Robert d’Artois, irmão de Luís IX e foi nomeado bailio do condado de Clermont em Beauvaisis no dia 11 de maio de 1279, onde permaneceu até 2 Embora a maior parte das obras daquele momento tenham sido redigidas em latim, o tratado em questão está em francês medieval e não foi, até os dias de hoje, traduzido para o francês moderno ou para qualquer outra língua de origem latina. Na verdade, existe uma tradução desta obra feita em 1971 pelo professor Hiroshi Hanawa da Faculdade de Direito de Kobi em língua japonesa (Hubrecht, 1974, p. 2). Trata-se, no entanto, de uma fonte que assume caráter mais amplo, pois ultrapassa os li- mites do território do condado de Clermont em Beauvaisis e se estende a condados vizinhos, onde vai buscar as bases para a descrição dos costumes da região. O quadro do condado de Clermont estende- se até onde a justiça funcionava, ou seja, abrange outras cidades, outros senhorios, outros condados que obedeciam basicamente às mesmas regras. 3 O bailio, antes de 1185, era um agente especial do rei ou de um senhor, responsável por diversas tare- fas. A partir desta data, é um funcionário da corte do rei que, temporariamente, é encarregado de funções essencialmente judiciárias e de controlar o trabalho dos prebostes responsáveis pela manu- tenção da ordem e pela polícia. P á g i n a | 102 Fronteiras & Debates Macapá, v. 4, n. 2, jul./dez. 2017 ISSN 2446-8215 https://periodicos.unifap.br/index.php/fronteiras a época em que expirava seu terceiro exercício regulamentar, ou seja, até 7 de maio de 1282.4 Os Costumes de Beauvaisis foram redigidos durante esse período e sabe-se que ele concluiu sua obra no ano de 1283.5 Os Costumes de Beauvaisis, ao contrário da maior parte dos coutumiers da épo- ca, não é uma obra anônima. Beaumanoir assina e data o tratado no final do último capítulo, o que não era nada comum para a época. Mas ele só se identifica para não correr o risco de ser contestado por causa de sua pouca idade ou de suas funções (§ 1982). Beaumanoir tinha apenas trinta anos de idade quando escreveu o tratado. De qualquer maneira, a espessura de seu trabalho, sua lucidez e o seu profundo conheci- mento do direito impressionam ainda hoje aqueles que sobre sua obra se debruçam. No parágrafo primeiro do prólogo, ele esclarece o espírito que o animava quando principiou a escrita de sua obra. Ele pretendia escrever um livro que ensinasse como se defenderiam aqueles que, “por azar e malfeito”, se envolvessem em processo judiciário, “utilizando-se do conhecimento do direito e dos costumes do condado de Clermont em Beauvaisis”, direito e costumes que ele mesmo pretendia “fazer respeitar em nome do conde e de seu conselho em vista de uma boa administração e para a paz de todos” (§ 1). Beaumanoir precisa também quais foram suas fontes: a jurisprudência, os hábi- tos e os costumes, reconhecidos desde muito tempo, mas que ele desejava registrar por escrito para que, desde então, fossem fixados (§ 6 e 7). Sua intenção de gravar por escrito esses hábitos e costumes pressupõe uma preocupação com uma questão im- portante para o mundo do direito nessa época: a influência do direito romano no pen- samento jurídico e a consolidação da escrita em detrimento de um direito, ainda em muitas regiões, baseado na transmissão oral. Beaumanoir acrescenta que, nos casos duvidosos e perigosos, ele recorreu à ju- risprudência dos senhorios vizinhos e que, quando isso não funcionou, ele recorreu então ao “direito comum”6 do reino. Ele abre assim um espaço maior para seu campo 4 Essas datas são conhecidas, sobretudo, graças à obra de Bordier (H.L.), Philippe de Rémi, sire de Beau- manoir, 1246-1296, de 1869-1873, que é citado por Am. Salmon na sua introdução. 5 “Ici fine Phelippes de Beaumanoir son libre lequel il fist des coustumes de Beauvoisins en l’an de l’incarnation de Nostre Seigneur mil.cc.lxxx. et iii” (Beaumanoir, 1970, p. 502). 6 Entre os eruditos persiste uma pendência sobre o que Beaumanoir entende por “direito comum”. De um lado, Salmon afirma que esta expressão evoca as leis aplicáveis a todo reino e, de outro, Georges Hubrecht, o grande historiador do direito que fez o comentário histórico e jurídico do coutumier de P á g i n a | 103 Fronteiras & Debates Macapá, v. 4, n. 2, jul./dez. 2017 ISSN 2446-8215 https://periodicos.unifap.br/index.php/fronteiras de pesquisa recorrendo aos costumes da vizinhança e ao direito comum do reino da França e isso no momento mesmo em que se sente forte a tendência em estabelecer uma certa comunidade dos costumes da França real. Percebe-se que ele procura ul- trapassar os casos particulares para definir regras gerais, ainda mais quando se sabe que, ao contrário dos outros coutumiers, o nome das partes envolvidas, dos juízes e as datas não o interessam. Trata-se de uma fonte complexa de onde se pode extrair muitas informações para se conhecer a sociedade do norte da França e a justiça do século XIII e onde se pode encontrar embasamento preciso sobre as regras fixadas para os direitos de justi- ça e de polícia dos senhores feudais que nos ajudam a compreender a natureza e o funcionamento do senhorio e do poder senhorial. Senhorio e poder senhorial no debate historiográfico contemporâneo Um dos temas fundamentais para discutir as relações de poder na Idade Média é o senhorio e o poder senhorial a ele associado. Tema incontornável não apenas por- que é obrigatório nos programas das disciplinas de História Medieval na França, mas essencialmente porque permite-nos compreender o mundo que surge logo após a Re- volução Francesa quando, finalmente, o senhorio desaparece na França. O senhorio é a célula primeira da vida cotidiana entre os séculos X e XVIII, inclusive na sua especifi- cidade urbana ainda que minoritária. Trata-se de um sistema social que além de de- terminar as relações sociais, econômicas e jurídicas entre os dominados e os domina- dores durante muitos séculos, determinou também as mentalidades, mantido por uma ideologia que o legitimou e que serviu, evidentemente, à classe dominante com o a- poio do clero para justificar esse sistema social. Na Europa Ocidental, esse sistema perdurou até a Revolução Francesa. Mas se considerarmos que a servidão é um dos elementos que participa da definição do sistema senhorial, foi preciso esperar até me- ados do século XIX para que fosse abolido na Europa Central e Oriental e, até 1917, para que fosse abolido na Rússia. De acordo com Jérôme Baschet, desde a obra clássica de Georges Duby, Eco- nomia rural e a vida no campo no Ocidente Medieval (1977), sabemos que a partir do Beaumanoir, afirma tratar-se de “uma espécie de fundo comum apresentando sobre diversos pontos uma unidade”, talvez regras de direito consuetudinário (Hubrecht, 1974, p. 5). P á g i n a | 106 Fronteiras & Debates Macapá, v. 4, n. 2, jul./dez. 2017 ISSN 2446-8215 https://periodicos.unifap.br/index.php/fronteiras outros, e o prestígio por pertencer a um grupo social excepcional (1995, p. 14). Para Philippe Contamine, o senhorio implica primeiramente uma ideia de do- minação. Ele analisa os diversos empregos que o homem medieval dava aos termos “senhor” e “senhorio” e mostra que o aspecto principal que sobressai dessas observa- ções é o caráter de dominação: Especialmente no final da Idade Média, o termo senhorio implica an- tes de mais nada a ideia de dominação. Deus é nosso senhor. O rei exerce seu senhorio sobre o reino da França, seus habitantes e seus súditos. Fala-se do senhorio de Veneza, do senhorio de Florença, do senhorio do duque da Bretanha ou do duque de Bourbon. Textos nos mostram que o marido deve ter o senhorio sobre sua esposa [...] (1995, p. 26). Como explicar essa dominação? Quais são os elementos sobre os quais repou- sam o senhorio e o poder senhorial? Para Robert Fossier, esse poder é primeiro de ordem social, e mesmo, de ordem moral, espiritual e carismático. O senhor e seus pa- res são socialmente diferentes dos outros. São nobilis, ou seja, “dignos de serem co- nhecidos”, de acordo com a etimologia da palavra (1995, p.19). O senhor é diferente por seu modo de vida: seu código moral é “tomar para distribuir, exigir para gastar”, por isso ele tem que ser generoso, mas de acordo com as medidas pregadas pela Igreja que sempre oscilou entre o orgulho e a avareza. Ele é diferente por causa da sua apa- rência exterior e de seus costumes: ele come muito, dá esmola, a eles são reservados alimentos raros, o vinho forte, roupas de preço, uso do vermelho. Sua moradia é dife- rente da dos outros. O castelo domina as casas menores pelo tamanho e pela qualida- de da construção, mas também por ser uma edificação que se encontra acima de todas as outras (Fossier, 1995, p. 19). O nome de sua família o distingue do vulgar. Ele sabe cavalgar e essa é uma manifestação exclusiva da nobreza. Ele tem direito de albergue ou direito de gîte que lhe permite se alojar na casa de seus súditos em certas ocasiões, o que significa tam- bém estabelecer contatos e, por que não, laços de afeição (Fossier, 1995, p. 20). Seu poder é também de ordem econômica, e esse campo de estudo foi, sem dúvida, o mais amplamente estudado pelos historiadores. Ele é senhor da terra e do dinheiro. A Igreja, nesse caso, ocupa o lugar mais importante e isso, provavelmente, porque os arquivos estão repletos de sinais de sua riqueza. Com o tempo grandes pro- P á g i n a | 107 Fronteiras & Debates Macapá, v. 4, n. 2, jul./dez. 2017 ISSN 2446-8215 https://periodicos.unifap.br/index.php/fronteiras dutores rivalizam com o senhor, mas até o século XIII é ele que tem condições de se equipar, adquirir máquinas, sementes e ferramentas de todos os tipos que o progresso da técnica colocou à sua disposição. Essa dominação, quase de tipo técnico, conforme Robert Fossier, está na ori- gem da constituição daquilo que foi chamado de “renda senhorial”. No entanto, como estudos recentes mostraram, os arrendamentos recebidos em espécie ou in natura sobre as terras, não compõem o essencial da renda senhorial; talvez 5% do total, por- que o grosso vinha mesma da transmissão hereditária (1995, p. 20). Os serviços exigi- dos são rapidamente substituídos por taxas e também não são muito rentáveis. É, en- tão, sobretudo o exercício da justiça, as multas e os costumes que garantem ao senhor uma parte essencial de sua renda e seu poder. Enfim, sobre o plano político ele tem a mão forte, mas não quer dizer que é o tirano da aldeia. Isso seria esquecer que o peso de sua mão corresponde à proteção que é dada em contrapartida. O bellator não é esse terrorista que alguns historiadores estigmatizaram. No esquema das três ordens ele aparece como o mais ameaçado, a mais vulnerável das criaturas de Deus, porque é exatamente sua atividade de domina- ção que o expõe, mais que os outros, aos riscos danação (Fossier, 1995, p. 21). A hierarquização dos senhorios acompanha o escalonamento dos títulos de no- breza: principados, ducados, marquesados, condados, viscondados e, mais tarde, as baronias. De acordo com Olivier-Martin (1992), esta última categoria corresponderia aos grandes senhorios, à qual se junta ainda o senhorio eclesiástico. O verdadeiro se- nhorio típico é a castelania que tem como centro um castelo do qual dependem os feudos necessários à manutenção normal de sua guarnição. O castelo concentra o po- der jurídico, os mantimentos, o serviço militar, etc. Robert Fossier e a maioria dos medievalistas contemporâneos descartam a tese de uma organização anárquica da sociedade feudal. Para ele, não há, para a época em questão, outro tipo de organização que enquadraria melhor os homens. Ele chama a atenção também para a diversidade regional. Olivier-Martin também rejeita a teoria de uma feudalidade anárquica. Assim, ao contrário da anarquia, a feudalidade revela-se como uma grande tentativa de orga- nização social que se arranja da melhor forma possível para suprir as deficiências do Estado. No quadro do senhorio, diz ele, o esforço de organização é nítido: P á g i n a | 108 Fronteiras & Debates Macapá, v. 4, n. 2, jul./dez. 2017 ISSN 2446-8215 https://periodicos.unifap.br/index.php/fronteiras Os senhores não parecem ter abusado de sua situação privilegiada sobre os habitantes de seu senhorio. Eles precisavam deles para construir, consertar, vigiar o castelo; uma solidariedade elementar os unia para fazer face aos perigos de uma era de violência (1992, p. 129). No entanto, por mais cooperativa que pareça a organização social do senhorio, não podemos subestimar o peso da autoridade senhorial. Por trás dessa autoridade situa-se o poder, ou seja, os meios de exercer formas de controle sobre os outros. Po- der que se apresenta sob diversas formas, no plano econômico, político, social, moral, etc., escondendo dois fatores fundamentais: o econômico, pois é o senhor feudal que tem o domínio sobre as terras, e o social, na medida em que guarda uma preeminência social, moral e afetiva, pois tem o prestígio por pertencer a um grupo social excepcio- nal que provoca o afeto, o respeito, o temor e a submissão daqueles que estão nos degraus abaixo. Não se rejeita a tese de Olivier-Martin sobre a cooperação e a solidariedade que existe entre o senhor e seus súditos. Acredita-se que o poder senhorial deve ser definido a partir dos três pilares em que se assenta: o da cooperação e solidariedade, o da dominação e, um terceiro que permite o equilíbrio, o da exploração. Georges Duby (1977) trata desse aspecto no seu livro sobre economia rural e a vida no campo. Segundo ele, a exploração aparece primeiramente no trabalho. Era graças à importância da quantidade de mão de obra em seu domínio que o senhor feudal podia esgotar a exploração em seu território. O trabalho dos servos constituía, nos primeiros anos da época feudal, a principal fonte de riqueza do senhor. A partir do século XII, a exploração muda um pouco de figura, ou melhor, ganha uma nova forma. Duby defende a tese de que, a partir desse momento, a maior parte da fortuna senhorial vinha do exercício da justiça. Havia muito tempo que os servos estavam sujeitos à correção de seu senhor e quando as instituições públicas responsá- veis pelo exercício da justiça se enfraqueceram, os senhores locais passaram a exigir do senhor regional o direito de fazer a justiça e de punir seus homens (1977, p. 79). As punições poderiam assumir a forma de pagamento em espécie e, segundo Duby, o senhor feudal aproveitava o máximo desse direito, aumentando assim sua riqueza. Quase sempre as multas cobradas ultrapassavam o valor de que dispunha o servo, então o senhor tirava de sua casa o que podia (1977, p. 82). No capítulo XXX dos P á g i n a | 111 Fronteiras & Debates Macapá, v. 4, n. 2, jul./dez. 2017 ISSN 2446-8215 https://periodicos.unifap.br/index.php/fronteiras Observa-se que a divisão territorial acompanhou a privatização da justiça ou, como explica Robert Boutruche (1970, p. 126-127), “os fourches (forcados) e as cruzes dispostas no interior e nos limites dos senhorios políticos são o sinal das justiças”. Cada senhor reivindica o conhecimento dos delitos cometidos por seus subordinados e o conhecimento das causas nas quais estão implicados os habitantes de sua terra. A jus- tiça é o símbolo por excelência da autoridade. Os direitos de justiça e de polícia são principalmente aqueles que permitem ao senhor julgar, punir seus homens e afirmar seu poder de ban. Esses são também os direitos que garantem a manutenção da ordem na área de dominação do senhor. O exercício de seu poder de justiça permite ao conde de Beauvaisis, por exem- plo, cobrar uma multa por profit de défaut (§60), caso em que uma pessoa é citada para comparecer em justiça e não pode ir no dia da convocação. Essa pessoa teria que ter feito um contremand ou uma essoine. O contremand é uma declaração feita no nome da parte citada dizendo que ela só poderá comparecer dentro de quinze dias. A essoine é uma desculpa que permite não se apresentar na data da convocação. A es- soine é aceita somente uma vez, ou seja, ela não pode ser repetida; ela deve ser leal e afirmada sob a lei do juramento se a corte assim o exigir. Nas palavras de Beaumanoir, “[...] et bien se gart qu’il ait loial essoine, car il convenra jurer son essoine en court se li sires veut, et, s’il ne le veut jurer, il sera tournés en défaute”8 (§ 60), ou seja, se não apresentar leal essoine, a pessoa convocada a comparecer em justiça sofrerá as conse- quências de seu não comparecimento, qual seja, pagará uma multa conhecida por pro- fit de défaut. Se em um processo o pleiteante não se apresentar para sustentar sua queixa contra outrem, ele deverá ao senhor uma multa por ter, de alguma forma, incomoda- do a corte inutilmente. Se é o defensor que não comparece, ele perde imediatamente o processo; perde também a posse do bem que lhe é reclamado quando este for o caso. Se as duas partes não comparecem, o senhor justiceiro coloca o defensor em estado de défaut, ou seja, de não comparecimento até que ele saiba quem é o verda- deiro culpado e possa cobrar a multa daquele que cometeu o delito (§ 85). 8 “[...] e ele cuidará que seja leal essoine (pedido de desculpas), pois ele deverá jurar sua essoine diante da corte se assim o senhor o desejar, e, se ele não quiser prestar juramento, ele será considerado cul- pado.” (§ 60). (Tradução da autora). P á g i n a | 112 Fronteiras & Debates Macapá, v. 4, n. 2, jul./dez. 2017 ISSN 2446-8215 https://periodicos.unifap.br/index.php/fronteiras O senhor, que deve guardar e proteger as estradas e as pessoas que nelas circu- lam, tem também a “justiça do caminho” e, para isso, basta que o caminho passe pela terra sobre a qual o senhor tem a justiça. Beaumanoir explica que, de direito comum, todo caminho, seja o de dezesseis pés, de trinta e dois pés ou de sessenta e quatro pés, são e pertencem, em todas as coisas, ao senhor que possui a baronia, estejam estes caminhos nas suas terras ou nas terras dos seus súditos e é deles toda a justiça e o senhorio dos caminhos (§ 721).9 A justiça desses caminhos é, particularmente, proveitosa para o senhor por causa da competência das infrações que neles são cometidas. Por exemplo, no caso onde a largura das estradas não é respeitada, as pessoas que moram nas bordas des- sas estradas podem ser castigadas devendo pagar uma multa, a menos que a ausência de demarcações não permita chegar a uma conclusão sobre a má-fé dos moradores ribeirinhos (§ 723 – 726). Qualquer movimentação que resulte em deterioração, estrago, perturbação ou desordem e, também a construção de muros, fossos ou edificações, ou mesmo a reti- rada de terra estragando o caminho, é considerada crime sujeito a uma multa, sendo os responsáveis por tais atos obrigados a refazerem o caminho para deixá-lo exata- mente como era antes. Também é tido como um grave delito o deslocamento de mar- cos (§ 850) que é unido como uma infração de voirie (referente à conservação das es- tradas). A multa por infração de voirie nos caminhos públicos era de sessenta sous pa- ra os vilãos e de sessenta libres para os nobres (§ 727). O costume permitia ainda ao senhor exigir de seus súditos encargos para a ma- nutenção das estradas e isso durante um período de até três anos, pois se este prazo fosse ultrapassado seria um novo costume que exigia uma autorização do rei (§ 731). A parte das despesas que cada um deveria pagar era determinada de acordo com seu avenant, ou seja, de acordo com o que produzia na terra, esta estimativa era feita pelo serment de bonnes gens, pessoas escolhidas pelo senhor e sob o seu controle (§ 732). Os objetos perdidos e qualquer coisa que fosse encontrada nas estradas do se- 9 “De droit commun tuit li chemin, meismement cil de .XVI. piés, de .XXXII. piés, sont et apartienent en toutes choses au seigneur de la terre qui tient en baronie, soient li chemin par mi leur demaine ou par mi le demaine de leur sougiès, et est toute la justice et la seignourie des chemins leur.” (§ 721). P á g i n a | 113 Fronteiras & Debates Macapá, v. 4, n. 2, jul./dez. 2017 ISSN 2446-8215 https://periodicos.unifap.br/index.php/fronteiras nhorio deviam ser entregues à alta justiça do lugar. Se apossar de um objeto encon- trado em um caminho era considerado uma forma de furto e o crime era condenado como tal. Se ninguém reclamasse o objeto encontrado provando que este lhe perten- cia, o objeto permanecia com o senhor a título de espólio (epave), ou seja, sem dono. Aquele que não agisse de tal maneira, corria o risco de ter que pagar uma multa, cujo montante corresponderia ao valor do objeto encontrado e não declarado (§ 738). As punições podiam ser exigidas sob a forma de pagamento em espécie e o se- nhor tirava disso o máximo proveito, aumentando assim sua fortuna. De acordo com Duby, algumas vezes as multas impostas ultrapassavam largamente o valor de que dispunha o servo, nesse caso, o senhor podia entrar em sua casa e retirar dali o que quisesse (1977, p. 82). No capítulo XXX do coutumier, Beaumanoir cita diversas situações de recolhi- mento de multas por crimes cometidos. Os crimes mais graves, o homicídio, o assassi- nato, a traição e o estupro, eram condenados com a pena máxima, a pena de morte. Os outros crimes menos graves eram sancionados com multas ou confiscações de bens. A sanção por crimes menos graves como, por exemplo, crimes que causassem um leve ferimento, consistia em uma multa cujo valor variava de acordo com a situa- ção social daquele que cometeu o crime, com o lugar onde o crime ocorreu e com o costume local aplicável. Se o culpado fosse um vilão, a multa para o crime descrito logo acima seria de cinco deniers; se se tratasse de um nobre, a multa seria de dez sous (§ 839). Se os golpes tivessem sido dados no mercado onde havia a presença de outras pessoas, a multa aumentaria para sessenta sous se o criminoso fosse um vilão e para sessenta libres, se o crime fosse cometido por um nobre (§ 839). Neste caso pre- ciso, o valor da multa aumentava consideravelmente porque o mercado era uma área sob a proteção do conde, a agressão corresponderia então a uma quebra de proteção. No caso de crimes com ferimentos graves, o culpado permanecia preso até o momento em que a vítima estivesse fora do risco de perder a vida. Se a vítima viesse a falecer, a sanção era a mesma do homicídio, a pena máxima. Se a vítima sobrevivesse, o culpado deveria pagar uma multa de sessenta sous se vilão e, sessenta libres, se no- bre (§ 840). Podemos encontrar ainda no coutumier de Beaumanoir várias situações que permitiam ao senhor tomar posse dos bens de seus súditos. Beaumanoir cita o exem- P á g i n a | 116 Fronteiras & Debates Macapá, v. 4, n. 2, jul./dez. 2017 ISSN 2446-8215 https://periodicos.unifap.br/index.php/fronteiras cia epistemológica de suas épocas, quase sempre procuraram encontrar na Idade Mé- dia um modelo primitivo da justiça atual fazendo uma espécie de decalque primitivo do nosso próprio sistema jurídico. Com o auxílio da antropologia jurídica, os novos historiadores do direito desmontaram as evidências desses princípios e mostraram que havia sim uma justiça organizada, um sistema jurídico com um funcionamento próprio e um direito complexo, como exemplifica perfeitamente o tratado de Philippe de Be- aumanoir. Com esse breve estudo dos direitos de justiça e de polícia nos Costumes de Be- auvaisis e à luz da antropologia jurídica, procuramos entender como se davam as rela- ções de poder entre senhores feudais e seus súditos por intermédio dos direitos fixa- dos nos costumes. A análise dos direitos de justiça e de polícia nos Costumes de Beau- vaisis permitiu discernir um pouco das formas de organização social do senhorio e as dinâmicas das relações de poder que caracterizam o tipo de autoridade que é chama- da de ban e que se refere não apenas a um poder de comando, mas ao poder de justi- ça. Os exemplos selecionados revelam a importância que assume o exercício da justiça nos costumes de Beauvaisis. Confirmam a tese de que boa parte da renda senhorial, também em Beauvaisis, advinha desses direitos de justiça e de polícia e que, era graças ao seu exercício de justiça que o senhor podia adquirir o poder necessário para exigir de todos seus súditos os outros direitos. A obra de Philippe de Beaumanoir evidencia que o senhorio é, antes de tudo, uma porção de terra, porém habitada e, acima de tudo, habitada por súditos. É uma porção de terra onde o senhor, que pode ser proprietário ou não, exerce um direito real de soberania. Aí também, tal como nos ambientes mais elevados de homenagem militar, existiam “homens de outros homens”. Nos degraus inferiores, as relações de dependência encontravam seu quadro natural neste grupamento que sobreviveu mui- to tempo após o declínio da vassalagem: o senhorio. No quadro do senhorio, a obra de Beaumanoir mostra bem as duas formas de sujeição evidenciadas por Marc Bloch: “a que pesava sobre o homem em sua pessoa; a que o atingia somente enquanto deten- tor de uma porção de terra” (1994, p. 233). O senhorio assiste, durante o século XIII, a um período de prosperidade eco- nômica, um movimento de modificações em sua organização. Este movimento é a- companhado pela ampliação das necessidades financeiras dos senhores e, em conse- P á g i n a | 117 Fronteiras & Debates Macapá, v. 4, n. 2, jul./dez. 2017 ISSN 2446-8215 https://periodicos.unifap.br/index.php/fronteiras quência, pelo aumento da exploração fiscal. Neste momento, é sobretudo o exercício da justiça que permite-lhes prover às suas despesas e aumentar sua fortuna. É nesse quadro que se insere a sistematização conduzida por Beaumanoir, bailio do rei no Condado de Clermont de Beauvaisis situado nos domínios reais. No que diz respeito à relação entre o poder real e o poder senhorial, muitos historiadores acreditaram ser o século XIII o momento do fortalecimento do poder real em detrimento do enfraquecimento do poder senhorial. O que se percebe com a leitu- ra de Beaumanoir é que, de fato, o rei procurava cada vez mais se impor promulgando ordenanças e enviando oficiais especializados para cuidar dos assuntos jurídicos nos seus domínios. No entanto, os direitos senhoriais ainda se mostram fortes como nos períodos anteriores ao auge do feudalismo. De acordo com Dominique Barthélemy (1990), não se pode falar em um enfraquecimento do senhorial neste período. O autor contesta a tese colocada pela escola mutacionista do ano mil segundo a qual o século XIII seria um período de transição que, do ponto de vista político, se caracterizava pela perda de poder dos senhores feudais e pela imposição do poder real. Ele defende a tese de que o poder senhorial continua forte no século XIII e cresce paralelamente ao poder real (1990, p. 199-252). Os direitos senhoriais consolidados no coutumier de Beauvaisis retratam um fortalecimento das dependências características do feudalismo; dominação conjugada com as possibilidades de exploração por ela abertas. Uma conclusão apressada seria a de que a consolidação dos costumes elaborada por um funcionário do rei demonstra- ria o fortalecimento do poder real e, em consequência, do Estado. Contudo, como bem notou Jacques Le Goff, “a monarquia, longe de ser incompatível com a feudalidade, se combina com as estruturas e mentalidades feudais e consolida, assim, sua força” (1996, p. 65). REFERÊNCIAS ANDERSON, Perry. 1982. Passagens da Antiguidade ao Feudalismo, 2a edição. Porto, Biblioteca das Ciências do Homem, Edições Afrontamento. BARTHÉLEMY, Dominique. 1990. L’Ordre Seigneurial (XIème – XIIème), Collection Nou- velle Histoire de la France Médiévale, vol. 3. Paris, Seuil. ______. 1992. Qu’est-ce que le servage en France au XIème siècle?, Revue Historique, n. 287. BASCHET, Jérôme. 2006. A Civilização feudal: do ano mil à colonização da América, São P á g i n a | 118 Fronteiras & Debates Macapá, v. 4, n. 2, jul./dez. 2017 ISSN 2446-8215 https://periodicos.unifap.br/index.php/fronteiras Paulo, Editora Globo. BEAUMANOIR, Philippe de. 1970. Coutumes de Beauvaisis, volumes 1 e 2. Paris, Éditions A. et J. Picard. BLOCH, Marc. 1994. La société féodale. Paris, Albin Michel. BOUTRUCHE, Robert. 1970. Seigneurie et Féodalité. L’apogée (XIème – XIIIème). Paris, Aubier. CHARBONNIER, Pierre. 1995. Essai d’un classement des redevances seigneuriales. In: FOSSIER, Robert, Seigneurs et seigneuries au Moyen Âge. Paris, Éditions du C.T.H.S., pp. 139-151. CONTAMINE, Philippe. 1995. La seigneurie en France à la fin du Moyen Âge, In: FOSSIER, Robert, Seigneurs et Seigneurie au Moyen Âge. Paris, Éditions du C.T.H.S., pp. 25 – 43. DUBY, Georges. 1977. 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