Baixe Sócrates e a filosofia e outras Resumos em PDF para Origem da Linguagem, somente na Docsity! NOÇÕES GERAIS SOBRE ORIGEM DO ESTADO E ESTADO MODERNO. Eduardo da Rosa Ramos 1 INTRODUÇÃO Os conceitos de Estado são variados e possuem, cada qual, diversidades referentes às correntes doutrinárias ou ao ideário teórico dos que os propõe, bem como o momento histórico da concepção, entre outros fatores. Além disto, o Estado é um ente dotado de complexidade extrema, podendo ser analisado sob inúmeros enfoques, como político, jurídico, sociológico, etc. Neste trabalho pretende-se apresentar noções teóricas e históricas de várias correntes, de vários pensadores sobre o tema Estado, sem tentar fechar a possibilidade de futuras e maiores discussões sobre o tema. 1. ORIGEM DO ESTADO O termo Estado provém do latim status significando, de forma literal, estar firme. Segundo definição de Fernando de Azevedo, o referido termo pode ser definido como “fixo, imóvel, decidido, regular e constante” 2 , empregado para designar uma condição geral de estado, de ser, como, por exemplo, status libertatis. O Estado, hodiernamente concebido, significa uma situação durável de convivência de uma sociedade politicamente organizada, ou ainda, citando o conceito da doutrina tradicional, o “Estado é a Nação politicamente organizada” 3 . O conceito de Estado mais difundido, segundo Manuel Gonçalves Ferreira Filho é o que estabelece ser ele “uma associação humana (povo), radicada em base espacial (território), que vive sob o comando de uma autoridade (poder) não sujeita a qualquer outra (soberania)” 4 . Nesta noção se encontram presentes os elementos do Estado, quais sejam, povo, território, poder e soberania. Salienta Giorgio Del Vecchio que o Estado é “a unidade de um sistema jurídico que tem em si mesmo o próprio centro autônomo e que é possuidor da suprema qualidade de pessoa” 5 . Hely Lopes Meirelles compila várias noções de Estado, afirmando, com fundamento em vários doutrinadores, que o Estado pode ser conceituado, analisando-se aspectos sociológicos, políticos, jurídicos, entre outros. Sob o aspecto sociológico, Estado pode ser definido como “corporação territorial dotada de um poder de mando originário (Jellinek)”; sob o prisma político, o Estado “é comunidade de homens, fixada sobre um território, com potestade superior de ação, de mando e de coerção (Malberg)”; constitucionalmente, o Estado “é pessoa jurídica territorial soberana (Biscaretti di Ruffia)” 6 . Para Geörg Jellinek, “o Estado, enquanto ser social é uma realidade histórico-cultural; enquanto objeto do Direito, ser jurídico, é uma abstração ideal” 7 , isto é, o Estado possui uma personalidade social e uma personalidade jurídica. Hans Kelsen, por sua vez, nega a realidade social, analisando o Estado sob a ótica de realidade jurídica, considerando-o “uma pessoa jurídica, ou seja, como uma corporação” 8 ; de igual forma, Duguit conceitua o Estado como “criação exclusiva da ordem jurídica e representa uma organização da força a serviço do direito” 9 . Ao conceituar o Estado, Alexandre Groppali assim se manifesta: “O Estado, inegavelmente, significa o domínio dos mais fortes e organiza os serviços públicos, mas seria revelar um conceito unilateral da realidade, o de não se admitir que é no interesse da coletividade também que esse domínio é exercido e que o Estado, além dos serviços públicos, deve visar outros fins mais altos, de natureza ética e social, que perduram no tempo, se não quer transformar-se, degradando-se, em um mero órgão técnico de administração” 10 . 1 EDUARDO DA ROSA RAMOS. Bacharel em Direito pela UNESP/Franca, Mestre em Direito Público pela UNIFRAN. Docente do Curso de Direito, Centro Universitário da Fundação Educacional Guaxupé, UNIFEG, Minas Gerais, Brasil 2 AZEVEDO, Fernando de. Pequeno dicionário latino–português. 5 ed. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1953, verbete status. 3 PAUPÉRIO, Artur Machado. Teoria geral do estado: direito político. 8 ed. Rio de Janeiro: Forense, 1983, p. 35. 4 FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Curso de direito constitucional. 27 ed. atual. São Paulo: Saraiva, 2001, p. 45. 5 DEL VECCHIO, Giorgio, apud DALLARI, Dalmo de Abreu, Elementos de teoria geral do estado. 20 ed. atual. São Paulo: Saraiva, 1998, p. 117. 6 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 19 ed. atual. São Paulo: Malheiros, 1994, p. 56. 7 JELLINEK, Geörg. Apud CARVALHO JÚNIOR, Clóvis. Teoria do Estado: O pensamento sobre o Estado no século XX, p. 21. 8 KELSEN, Hans. Teoria Geral do Direito e do Estado. [trad. Luís Carlos Borges; ver. téc. Péricles Prade]. 2 ed. – São Paulo: Martins Fontes, 1992 – (Col. Ensino Superior), p. 183. 9 DUGUIT, apud MALUF, Sahid. Teoria Geral do Estado. 24 ed. rev. atual. São Paulo: Saraiva, 1998, p. 20. 10 GROPPALI, Alexandre. Doutrina do Estado. Trad. Paulo Edmur de Souza Queiroz. 2 ed. São Paulo: Saraiva, 1962, p. 264-5. Desta forma, o Estado é um organismo dotado de multiplicidade, e como tal, deve ser conceituado sob vários aspectos: em razão de seus elementos constitutivos, em razão de sua forma, ordenação e relações com outros sujeitos de direito e, finalmente, como sujeito de direito. Em relação aos elementos constitutivos, Alexandre Groppali salienta que o Estado “é um ente social constituído „de um povo organizado sobre um território sob o comando de um poder supremo, para fins de defesa, ordem, bem-estar e elevação‟” 11 . Os elementos constitutivos do Estado estão todos inseridos no conceito: povo – território – poder de mando – fim. Do ponto de vista de sua forma, ordenação e relações, Alexandre Groppali define o Estado como “uma ordenação jurídica, na qual um complexo de normas gerais e coercitivas regulam os órgãos e os poderes do Estado bem como as relações dos cidadãos entre si e as deles com o mesmo Estado” 12 , aqui o Estado atua como limitador das liberdades individuais e da própria atuação, impondo normas coercitivas, logo, obrigatórias. Como sujeito de direito, o autor define o Estado “como uma corporação territorial ou como uma instituição territorial, conforme os cidadãos sejam ou não admitidos na sua administração e governo” 13 . Assim, Estado pode ser conceituado em razão do momento, jurídico, histórico e social. Pelas teorias monárquicas, como objeto de direito; pela teoria monista expressão de direito e, ainda, segundo as teorias democráticas, como pessoa jurídica sujeito de direitos. Assim, inúmeras outras definições existem, mas em síntese, o Estado é ordem jurídica, dotada de poder soberano, tem como objetivo o bem comum de um povo situado em determinado território. Além do conceito, importante ressaltar que, desde o princípio tem se entendido que o Estado é uma unidade que compreende pluralidade de funções. “Aristóteles, p. ex., descreveu a diversidade das funções do poder estatal nas várias „magistraturas‟, antecipando a moderna teoria da separação dos poderes, que foi traçada por Locke e desenvolvida por Montesquieu” 14 , essa teoria visava fins liberais. 15 Com a teoria da separação dos poderes, pela primeira vez na história dos Estados organizados houve uma cisão entre a atividade administrativa e a atividade judiciária e legislativa. 2. EVOLUÇÃO DO ESTADO Localizar o ponto inicial, ou o momento de origem do Estado, a exemplo de traçar a conceituação mais precisa, é tarefa das mais árduas, tendo em vista o anacronismo encontrado entre as mais diversas obras e teóricos do Estado. Não obstante as diferenças encontradas nas obras relativas ao tema, a concepção de Estado e sua evolução é vital ao desenvolvimento do tema proposto, tendo em vista que a Administração é corolário da organização estatal. O Estado, como hoje entendido, é formação política recente, que sofre evoluções constantes, tendo em vista seu caráter dinâmico, “ele porém não se move em uma órbita própria e autônoma, mas faz parte de todo aquele complicado sistema de forças que agita e solicita a sociedade em sua evolução” 16 , a significar que a evolução do Estado é caracterizada por fenômenos históricos, sociais, culturais, econômicos, religiosos, entre outros, que se manifestam na sociedade. Pinto Ferreira sintetiza em cinco as fases de evolução sócio-culturais do Estado: “a) o Estado latente, em potencial, na organização tribal; b) o Estado primitivo de conquistadores; c) o Estado feudal; d) o Estado absoluto; e) e o Estado democrático e constitucional” 17 . As primeiras noções que se tem do Estado, são de cunho histórico, e remontam à polis grega e à civitas romana, contudo. Na Grécia antiga, a Estado-cidade era denominado polis, e caracterizava-se como monarquia patriarcal. No século VIII a.C., o surgimento da moeda cunhada 11 Op. cit. p. 265. 12 Op. cit. p. 266. 13 Op. cit. p. 266. 14 FRANÇA, Rubens Limongi – coord. Enciclopédia Saraiva do Direito. V. 33 São Paulo: Saraiva, 1977. Verbete Estado, Nelson Saldanha, p. 436-442. 15 A respeito da “teoria da separação dos poderes”, Baracho sustenta, como uma gama de doutrinadores, que Montesquieu não empregou em sua obra, o termo “separação de poderes”, tão pouco entendeu “que os órgãos investidos das três funções do Estado seriam representantes do soberano, acometidos de uma parte da soberania. Não está na obra do clássico francês qualquer explicação que leve ao entendimento de que uma teoria da separação dos poderes implica separação absoluta de órgãos que exercem a função executiva e a legislativa. Entendia que devia existir uma ação contínua dos dois poderes, um sobre o outro, uma verdadeira colaboração. Explicando o que se passava na Inglaterra, esclarecia que o Executivo participava na legislação, e o Legislativo exerce controle contínuo sobre o Executivo, e que aquele sistema repousa na colaboração constante e íntima dos poderes”. 16 GROPPALI, Alexandre. Doutrina do Estado.[trad. Paulo Edmur de Souza Queiroz] 2 ed. São Paulo: Saraiva, 1962, 95. 17 FERREIRA, Luís Pinto. Teoria Geral do Estado. 1 v. 3 ed. ver. amp. e atual. São Paulo: Saraiva, 1975, p. 174. A Revolução Francesa (1798) teve como pano de fundo as idéias dos liberalistas do século XVIII e traçou as seguintes máximas: “todo governo que não provém da vontade nacional é tirania; a nação é soberana e sua soberania é una, indivisível, inalienável e imprescritível; o Estado é uma organização artificial, precária, resultante de um pacto nacional voluntário, sendo o seu destino o de servir ao homem; o pacto social se rompe quando uma parte lhe viola as cláusulas; não há governo legítimo sem o consentimento popular; a Assembléia Nacional representa a vontade da maioria que equivale à vontade geral; a lei é a expressão da vontade geral; o homem é livre, podendo fazer ou deixar de fazer o que quiser, contanto eu sua ação ou omissão não seja legalmente definida como crime; a liberdade de cada um limita-se pela liberdade dos outros indivíduos; todos os homens são iguais perante a lei; o governo destina-se à manutenção da ordem jurídica e não intervirá no campo das relações privadas; o governo é limitado por uma Constituição escrita, tendo esta como partes essenciais a tripartição do poder estatal e a declaração dos direitos fundamentais do homem etc” 32 . Segundo o autor, “instituia-se, assim, o Estado liberal, baseado na concepção individualista” 33 . O Estado liberal é marcado pelas conquistas e ideais da Revolução Francesa, quais sejam, liberdade, igualdade, legalidade, entre outros. Assim, o ideal do Estado liberal é a menor intervenção na economia, com a adoção de políticas de câmbio-livre no comércio externo, bem como as garantias individuais, e observância da legalidade, com fulcro a limitar o poder do Estado sobre a esfera privada, afirmando-se, assim, o Estado liberal, como Estado de Direito. Adam Smith (1723 - 1790), pai do liberalismo econômico, revendo as proposições de Locke, preconizava a necessidade de manter no Estado, o sentido ético, isto é, admite um Estado voltado para a realização do bem estar coletivo, mas sob o auspício de outros fundamentos. Smith considera que a harmonia social só podia ser obtida através do egoísmo, entendido como o interesse pessoal de cada homem, salientando que o Estado não pode intervir na economia de mercado. Concorrência passa a ser expressão corrente, a assegurar o equilíbrio entre o mercado, estimulando o progresso, resumindo o papel do Estado ao estabelecimento da justiça, à manutenção das instituições não lucrativas e ao controle de emissão de moedas, o economista condenava a política mercantilista e a intervenção estatal na economia e no câmbio. Sieyés (1748 – 1836), visou desenvolver um processo representativo restrito, com fincas a adaptar as concepções liberais econômicas de Adam Smith, que propunha que a “solução dos conflitos sociais encontravam-se na livre concorrência de mercado” 34 conciliando-as com a realidade francesa do pós Revolução. Sua proposta pugnava pela igualdade do Terceiro Estado em relação ao clero e à nobreza, ordens privilegiadas (que, por exemplo, eram excluídas da política fiscal), “estruturando sua perspectiva jurídico-política de caráter unitário de nação” 35 . Para Sieyés cabia à Nação “uma autoridade anterior de estabelecer a ordem jurídica” 36 , contudo, o autor esbarrou na contradição existente entre o trabalho e as funções públicas, que até então eram atributos exclusivos da aristocracia. Hegel (1770 - 1831), por sua vez, introduz na Teoria do Estado, uma visão liberal tecnocrática. Para o doutrinador, o Estado se sobrepõe aos interesses particulares, colocando a salvo o que há de essencial em cada interesse, isoladamente considerado, impondo princípios de racionalidade à sociedade. Para Hegel, “não são a família e a sociedade civil que são condição de existência do Estado mas é o Estado, enquanto idéia da comunidade moral, que se divide em duas esferas, as quais deságuam nos indivíduos” 37 . A família e a sociedade, em Hegel, condicionam-se à idéia de Estado. Opõe-se ao pensamento de Hegel, Marx, com sua crítica marxista, que levaram a uma nova e revolucionária concepção de Estado, que pode ser entendida, como uma teoria econômica da origem do Estado 38 , apoiada, ainda, por Engels e Lenine. A teoria marxista, sinteticamente analisada, parte da constatação de que a sociedade, que compõe o Estado, encontra-se dividida em duas classes sociais – a dos capitalistas e a dos operários -, sendo o Estado, o elemento de dominação de uma classe sobre a outra, isto é, para Marx, “O Estado apenas representa o instrumento de dominação de uma classe sobre a outra, é 32 MALUF, Sahid. Teoria Geral do Estado. 24 ed. rev. atual. São Paulo: Saraiva, 1998, p. 126. 33 Op. Cit. 34 VIEIRA, José Ribas. Prefácio à obra A Constituição Burguesa – O que é o Terceiro Estado? – Emmanuel Joseph Sieyès. Rio de Janeiro: Líber Juris, 1986, p. 27. 35 VIEIRA, José Ribas. Prefácio à obra A Constituição Burguesa – O que é o Terceiro Estado? – Emmanuel Joseph Sieyès. Rio de Janeiro: Líber Juris, 1986, p. 27. 36 VIEIRA, José Ribas. Prefácio à obra A Constituição Burguesa – O que é o Terceiro Estado? – Emmanuel Joseph Sieyès. Rio de Janeiro: Líber Juris, 1986, p.26. 37 CARVALHO JÚNIOR, Clóvis. Teoria do Estado: O pensamento sobre o Estado no século XX, p. 41. 38 FERREIRA, Luís Pinto. Teoria Geral do Estado. 1 v. 3 ed. ver. amp. e atual. São Paulo: Saraiva, 1975, p. 143 um simples meio de exploração das classes dominantes sobre as classes dominadas, surgindo à medida em que se estrutura o regime da propriedade privada” 39 . Karl Marx contestava o Estado Liberal, que se tornara incapaz para resolver os conflitos de classes – capitalistas e operários. Caberia ao Estado buscar, além da igualdade jurídica, a igualdade econômica. Ou seja, o Estado era um “mal necessário”, pelo que, deveria ser transitório, isto é, deveria ser extinto como governo de pessoas, para dar lugar a um sistema de administração de coisas comuns. Além de contestar, Marx critica o Estado burguês, afirmando que ele “surge como elemento catalisador” do conjunto produção humana e divisão do trabalho, “o que se exterioriza por intermédio da força organizada (as forças armadas, a polícia) e o monopólio da administração racional (a burocracia e justiça)” 40 . Esse confronto, segundo Carvalho Júnior, “gerou uma série de guerras menores que desaguaram na 1ª Grande Guerra Mundial e levaram o Estado burguês de Direito ao colapso, marcado pelas crises públicas e as revoluções dos anos entre 1910 e 1930” 41 . No final do século XVIII, mercantilismo e absolutismo entram em crise, que eclodiu com a Era das Revoluções, que abrange o período compreendido entre o final do século XVIII e o início do século XIX, neste período ocorreram a Revolução Francesa, a Revolução Americana, a Guerra de Independência hispano-americana. Estes movimentos revolucionários fundamentavam-se na idéia de Estado-Nação e soberania popular, que tem suas origens em Rosseau, fulminando nas noções de nacionalismo e centralização. Além dos fatos relacionados com as revoluções Francesa, Americana e de Independência hispano-americana, a Revolução Industrial, iniciada em 1770, na Inglaterra, gerou uma nova realidade social. Produziu não só o operário, mas principalmente, o desemprego, transformando, desta forma, o trabalho humano em mercadoria, e como tal, sujeita às leis de mercado, sobretudo, à lei da oferta e procura. Em razão do desemprego crescente, os salários tornaram-se ínfimos e homens e mulheres foram relegados à situações de miséria, passando a depender da “caridade pública”. O Estado liberal não estava apto a lidar com tais situações, posto que seu objetivo era manter a ordem pública, assegurando aos homens a paz social, a liberdade e a igualdade de direitos. A situação fática levou à reação da Igreja, através da Encíclica Rerum Novarum, de Leão XIII, de 15 de maio de 1891, descrevendo a situação vivida pela sociedade, bem como analisando suas causas e orientando o Estado sobre como deveria agir em relação aos problemas sociais que dominavam toda a Europa. A partir da Encíclica Rerum Novarum o Estado liberal passou a intervir na economia 42 . Preleciona, ainda, Maluf, que onde o Estado liberal mostrou-se frágil ante os problemas sociais, ocorreram revoluções violentas, como na Rússia, na Itália, na Alemanha, na Polônia e em outros países. Quando o Estado liberal atuou, transformou-se, “de maneira pacífica evoluindo para a forma social-democrática, através de reformas constitucionais e medidas legislativas. Tornou-se evolucionista, intervindo na ordem econômica, colocando-se como árbitro nos conflitos entre o capital e o trabalho, superintendendo a produção, a distribuição e o consumo.” 43 3. ESTADO MODERNO Considera-se que a fase inicial do Estado Moderno correspondia ao absolutismo monárquico, intimamente relacionado com o mercantilismo. O Estado liberal é, considerado, um segundo estágio do Estado Moderno, passando-se, posteriormente aos chamados Estados Constitucionais e Sociais. Rogério Medeiros Garcia Lima, sobre esta evolução salienta que “O Estado moderno é o tipo histórico de Estado característico da Idade Moderna e Contemporânea (séculos XVI ao XX), definindo-se pelo aparecimento do próprio conceito de Estado na acepção hoje adotada. Costuma- se dividi-lo em subtipos, a saber, Estado Corporativo, Estado Absoluto, Estado liberal e Estado constitucional do século XX” 44 . Segundo Lima, o crescimento do Estado corporativo levou ao fim o feudalismo no plano político; o Estado absoluto (séculos XVII – XVIII), quedou no pós Revolução Francesa, moldando- se, na seqüência, os aspectos do Estado Liberal; o Estado liberal é um subtipo do Estado Moderno, com início no século XVIII, apogeu durante o século XIX e declínio na primeira metade do século XX; de igual forma, o Estado constitucional é um subtipo do Estado Moderno. 39 FERREIRA, Luís Pinto. Teoria Geral do Estado. 1 v. 3 ed. ver. amp. e atual. São Paulo: Saraiva, 1975, p. 143. 40 CARVALHO JÚNIOR, Clóvis. Teoria do Estado: O pensamento sobre o Estado no século XX, p. 45. 41 Op.cit. p.46. 42 MALUF, Sahid. Teoria Geral do Estado. 24 ed. rev. atual. São Paulo: Saraiva, 1998, p. 129-132. 43 Op. Cit. 44 LIMA, Rogério Medeiros Garcia. O Direito Administrativo e o Poder Judiciário. Belo Horizonte: Del Rey, 2002, p. 22. O Estado Moderno implica “centralização do poder”, fundado no “princípio da territorialidade, da obrigação política” e da “progressiva aquisição da impessoalidade do comando político”, pode ser conceituado como “forma de poder historicamente determinada e, enquanto tal, caracterizada por conotações que a tornam peculiar e diversa de outras formas, historicamente também determinadas e interiormente homogêneas, de organização de poder” 45 . Weber (1864 – 1920), ao discorrer sobre o fenômeno da centralização do poder, afirma ser o mesmo “monopólio da força legítima”. Segundo o autor, o surgimento do Estado Moderno se confunde com a história da tensão existente entre a descentralização do poder, ou policentrismo do feudalismo e a centralização do poder do Estado territorial “concentrado e unitário” 46 , ou ainda, com a ampliação do espaço público, em detrimento do privado. A passagem do sistema feudal – policentrismo – para o Estado moderno – centralizado e unitário – decorreu, inicialmente, da cisão entre a Igreja e a política , ou seja, decorreu da ruptura da unidade político-religiosa que vigia na época pré-moderna, que pode ser situada entre os séculos XIII e XVI. Contudo, a própria Igreja fortaleceu o sistema político centralizado, pois com o fim de fortalecer o primado religioso, a Igreja, corporificada na pessoa do papa, reconhecia a autonomia da política, oferecendo terreno onde essa organização política podia sediar-se e fortalecer-se econômica e socialmente.Essa realidade confrontava-se com a realidade dos feudos, qual seja, propriedade delimitada de propriedade dos senhores feudais, fundadas na economia de subsistência do próprio feudo, consistente em atividades agrícolas e, no máximo, de troca, de organização social rígida e estática. Esse reconhecimento da autonomia política levou à passagem do “Estado para associações pessoais ao Estado territorial institucional”. 47 Após a transformação gradual do Estado de associações para o Estado institucional seguiu-se a passagem do senhorio terreno à soberania territorial 48 . O poder passa a ser político e o Estado adquire atributos inerentes a esta nova condição, “mundaneidade, finalidade e racionalidade” com o fim de adquirir “a imagem moderna de única e unitária estrutura organizativa formal da vida associada, de autêntico aparelho de poder, operacional em processos cada vez mais próprios e definidos, em função de um escopo concreto: a paz interna do país, a eliminação do conflito social, a normalização das relações de força, através do exercício monopolístico do poder por parte do monarca, definido como souverain enquanto é capaz de estabelecer, nos casos controversos, de que parte está o direito, ou, como se disse, de decidir em casos de emergência” 49 . O Estado passa a ser considerado como a “organização das relações sociais (poder) através de procedimentos técnicos preestabelecidos (instituições, administração), úteis para a prevenção e neutralização dos casos de conflito e para o alcance dos fins terrenos que as forças dominadoras na estrutura social reconhecem como próprias e impõem como gerais a todo o país” 50 . Todo poder demanda de um aparelho administrativo, a fim de que suas determinações sejam executadas. Para Weber, o Estado moderno tem como característica primordial o fato de constituir-se de um sistema de administração e de leis, modificáveis somente através de legislação específica, o que direciona as atividades coletivas de um quadro executivo, aqui considerado como centro de autoridade sobre toda e qualquer atividade exercida no território sobre o qual se exerce dominação, entendida como probabilidade de obediência a um determinado mandato. Dominação, em Weber, pode ter como fundamento diferentes causas de submissão, entre elas os costumes, reunião de interesses comuns, entre outras, contudo, para ser legítima, a dominação deve fundamentar-se em bases jurídicas, dividida, assim, em três espécies básicas: a dominação legal, decorrente de lei, ou de estatuto, através do qual os direitos podem ser criados ou modificados, caracteriza a denominada dominação burocrática, pela qual existe uma regra, que estatui um quadro administrativo de funcionários, com formação profissional, a dominação burocrática ou legal tem base do funcionamento técnico a disciplina do serviço; a dominação tradicional, que advém da crença na santidade das ordenações e no poder dos senhorios, é denominada dominação patriarcal e, finalmente, a dominação carismática, que decorre de 45 BOBBIO, Norberto, MATTEUCCI, Nicola e PASQUINO, Gianfranco. Dicionário de Política, v. 1. 12 ed. Brasília: UNB, p. 426. 46 WEBER, Max, apud BOBBIO, Norberto, MATTEUCCI, Nicola e PASQUINO, Gianfranco. Dicionário de Política, v. 1. 12 ed. Brasília: UNB, p. 426. 47 MAYER, Theodor, apud BOBBIO, Norberto, MATTEUCCI, Nicola e PASQUINO, Gianfranco. Dicionário de Política, v. 1. 12 ed. Brasília: UNB, p. 426. 48 BOBBIO, Norberto, MATTEUCCI, Nicola e PASQUINO, Gianfranco. Dicionário de Política, v. 1. 12 ed. Brasília: UNB, p. 426. 49 BOBBIO, Norberto, MATTEUCCI, Nicola e PASQUINO, Gianfranco. Dicionário de Política, v. 1. 12 ed. Brasília: UNB, p. 427. 50 Op.cit.