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A Identidade do Atleta de Picasso: Descoberta do Modelo da Famosa Obra, Esquemas de História

Este texto apresenta a história por trás de uma das obras mais famosas de pablo picasso, 'o atleta', pertencente à coleção do masp, museu de arte de são paulo. A peça, datada de 1909, foi descoberta recentemente ter sido baseada em joaquim antonio vives, proprietário do café do povo em horta de ebro, onde picasso e fernande olivier passavam tempos com os amigos locais. A peça, influenciada pela obra de cézanne, é uma representação cubista do modelo, com tons de cinza, terra e bege, e é comparada a outras obras de picasso inspiradas em horta de ebro.

O que você vai aprender

  • Quem posou para a pintura 'O Atleta' de Picasso?
  • Em que ano foi criada a pintura 'O Atleta' de Picasso?
  • Qual foi a influência de Cézanne na pintura 'O Atleta' de Picasso?

Tipologia: Esquemas

2022

Compartilhado em 07/11/2022

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A identidade do Atleta de Picasso
(in english, p. 154)
EUGÊNIA GORINI ESMERALDO
Mestra em História da Arte pelo IFCH/Unicamp.
Formada em jornalismo pela UFRGS, museóloga, curadora e
coordenadora de intercâmbio do MASP, Museu de Arte de São Paulo.
RESUMO O texto versa sobre uma das pinturas de Pablo Picasso, da coleção do MASP, O
atleta, realizada em 1909 pelo artista espanhol já radicado em Paris, numa de suas viagens à
terra natal. Não havia maior informação sobre o modelo da obra, considerada um exemplo
do cubismo analítico, e acaba de vir à luz o nome do retratado.
PALAVRAS-CHAVE Picasso, cubismo, pintura, fotografia, MASP.
ABSTRACT The text refers to Pablo Picasso’s painting The Athlete belonging to MASP, Museu
de Arte de São Paulo. It was painted in Spain, in 1909, when the Spanish painter was already
living in Paris and traveled to his region. There was no information about the sitter to this
painting – considered as an example of analytical cubism –, which has just come to light.
KEYWORDS Picasso, cubism, painting, photography, MASP.
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Baixe A Identidade do Atleta de Picasso: Descoberta do Modelo da Famosa Obra e outras Esquemas em PDF para História, somente na Docsity!

A identidade do Atleta de Picasso

(in english, p. 154)

EUGÊNIA GORINI ESMERALDO

Mestra em História da Arte pelo IFCH/Unicamp. Formada em jornalismo pela UFRGS, museóloga, curadora e coordenadora de intercâmbio do MASP, Museu de Arte de São Paulo.

RESUMO O texto versa sobre uma das pinturas de Pablo Picasso, da coleção do MASP, O atleta , realizada em 1909 pelo artista espanhol já radicado em Paris, numa de suas viagens à terra natal. Não havia maior informação sobre o modelo da obra, considerada um exemplo do cubismo analítico, e acaba de vir à luz o nome do retratado.

PALAVRAS-CHAVE Picasso, cubismo, pintura, fotografia, MASP.

ABSTRACT The text refers to Pablo Picasso’s painting The Athlete belonging to MASP, Museu de Arte de São Paulo. It was painted in Spain, in 1909, when the Spanish painter was already living in Paris and traveled to his region. There was no information about the sitter to this painting – considered as an example of analytical cubism –, which has just come to light.

KEYWORDS Picasso, cubism, painting, photography, MASP.

Eugênia Gorini Esmeraldo

Uma pequena cidade da Espanha, Horta de San Juan,^1 situada na comarca de Terra Alta, província de Tarragona, que à distância mais parece uma fortifi- cação, recebeu por duas vezes a visita de um artista que se tornaria um dos mais importantes do século XX: Pablo Picasso (Málaga, Espanha, 1881-Mougins, França, 1973). Da primeira vez a estadia deu-se entre junho de 1898 e fevereiro de 1899, por recomendação médica. Picasso ainda não havia completado 17 anos e chegara de Madri com escarlatina, bastante enfra- quecido. Os pais, preocupados e sem muitos recursos, seguiram o conselho do médico, que recomendou mu- dança de ares, e o enviaram para Horta de San Juan, cidade natal de Manuel Pallarés, amigo do pintor e que, mais tarde, seria assistente do pai de Picasso na escola de artes onde este lecionava. Pallarés o acompanhou e ali, junto com o amigo, Picasso passou um período de descobertas e realizou alguns trabalhos. Foram dese- nhos, a maioria hoje conservada no Museu Picasso de Barcelona, de animais, de figuras e, sobretudo, de pai- sagens que incluíam a imponente montanha de Santa Bárbara por detrás da cidade. Jaime Sabartés, 2 que foi seu amigo de juventude e que nos anos 30 tornou-se seu secretário, comentou sobre esse período:

Allí todo es nuevo para él, se asimila al ambiente. Hace como los otros. Va a los bosques, limpia el co- rral, cuida las bestas y pinta. Calza alpargatas como los campesinos. Aprende a cuidar un caballo, a curar una gallina, a sacar água del pozo, a tratar a la gente, a hacer un nudo sólido, a nivelar las cargas de un asno, a ordeñar una vaca, a preparar un buen arroz, a prender lumbre en el hogar y otras cosas.

Foi, enfim, pode-se dizer, um aprendizado para a vida.

A segunda ida a Horta ocorreria em 1909, quando Picasso já tivera algumas experiências inova- doras. Sob a influência da arte negra e da arte primi- tiva espanhola ele havia produzido entre 1905 e 1906 uma obra forte como o Retrato de Gertrude Stein , em que a fisionomia da amiga e colecionadora de suas telas lembra uma máscara angulosa, sendo vista hoje como um dos marcos do início do cubismo. No Salon d’Automne de 1906, Picasso e vários de seus compa- nheiros haviam ficado impressionados pelas pinturas de Paul Cézanne, em especial as Grandes banhistas , hoje no Philadelphia Museum of Art. Picasso confessaria ao

fotógrafo Brassaï que Cézanne foi seu único mestre 3 e é conhecida sua frase “Le petit-fils de Cézanne – c’est moi”.^4 Em junho de 1907 foi realizada em Paris a exposição póstuma de Cézanne na Galeria Bernhein- Jeune, que marcaria ainda mais a produção de Picasso, como se pode observar na obra Amizade (1907-1908), do Hermitage, em São Petersburgo, e, principalmente, em Les demoiselles d’Avignon , hoje no acervo do MoMA, em Nova York, que ele termina naquele mesmo ano e que se tornaria uma das obras mais significativas, não só de sua carreira mas da arte do século XX. Então, entre a metade de junho e o final de agosto daquele ano, Picasso retorna a Horta, após ter ido a Barcelona para as bodas de sua irmã, acompa- nhado da namorada, Fernande Olivier. A família ficara escandalizada com o fato de ele ter trazido consigo uma mulher sem ser casado oficialmente com ela. Logo após a chegada, Fernande teve uma crise renal e, ao lado disso, seu pai desaprovara os trabalhos que o filho lhe mostrou. Impaciente e desapontado, o ar- tista decide viajar para a localidade que conhecera na juventude e da qual guardava boas lembranças. A aldeia sempre se chamou Horta de San Juan, porém Picasso se referia a ela como Horta de Ebro,^5 ou “a terra de Pallarés”. O nome vem do rio Ebro, que passa pela região onde, mais tarde, ocorreria uma sangrenta batalha durante a Guerra Civil Espanhola. Quando o casal chegou à aldeia, despertou a curiosidade da população, com as roupas bonitas e elegantes: Picasso usava calças de veludo, e os chapéus com véu de Fernande foram um assombro. Também ali houve escândalo geral ao descobrirem que os dois não eram casados. Aos poucos fizeram alguns amigos e Picasso produziu muitas obras, tendo a temporada resultado no amadurecimento do pintor na produção cubista. Por muitas vezes ele repetiria que foi em Horta que tudo começou. A pequena aldeia favorecia, com sua conformação, as obras cubistas: casas volumosas formando uma massa geométrica e compacta com cheios, vazios, sombras e ângulos. A paisagem já era familiar ao pintor 6 e ele realizou vistas do lugar, na- turezas-mortas, retratos de Fernande Olivier e figuras masculinas. Uma destas pinturas entraria para a coleção do MASP, Museu de Arte de São Paulo, com o título de

Eugênia Gorini Esmeraldo

sentado”. E novamente aquela semelhança com o qua- dro do MASP na fisionomia.

Decidi então escrever a Elias Gaston, mencio- nando a biografia de Richardson e pedindo mais da- dos sobre Joaquim Antonio Vives. Como resposta,^13 Elias Gaston enviou não apenas os dados solicitados como também fotografias, entre as quais as de um café [Fig. 1], e corrigiu algumas informações, segundo ele, equivocadas, de Richardson. Detalhou:

En este Café, Picasso y Fernande Olivier se reunian por las noches con sus amigos de Horta (Tomas y Tobias Membrado, Nicolas Amposta, Manelet Garcia) y cantaban acompañados por la guitarra de Joaquim Antoni. En la obra de Richardson hay algunos errores en el capítulo de Horta. En 1909 Picasso estaba instalado en el Hostal del Trompet, en la plaza de la Iglesia. Delante mismo del Hostal estaba la panaderia con el horno de pan, propiedad de Tobias Membrado. Picasso instaló su taller de trabajo (estudio) precisamente en la buhardilla de la casa de Tobias Membrado (el panadero).

Informava ainda que Joaquim Antonio Vives Terrats (seu nome completo) nasceu em Horta de San Juan em 1879 e seu pai, Juan Vives Pujol, era músico. Em 1909, quando Picasso esteve em Horta pela segunda vez, Joaquim Antonio tinha 30 anos. Sua profissão oficial que consta no censo de 1905 era “cafetero”, ou seja, dirigia um café. Como o pai ele aprendeu música (sua foto [Fig. 2] o mostrava com o violão) e dividia seu trabalho de “cafetero” com o de professor de música e diretor da banda de música da aldeia. Elias Gaston informa ainda que Vives teria posado para outras obras de Picasso.^14 Ele morreu em Horta a 19 de janeiro de 1944. Pelas fotos que Gaston enviou observa-se que o artista usava o recurso da fotografia para registro inicial de obras que depois iria realizar. E aquela em especial confirmava o que eu já deduzira na publicação de Richardson e de Baldessari: o violonista de Horta de Ebro posara para Picasso compor O atleta , e assim a obra do MASP, tombada com o número de inventário 144, conhecida como Busto de homem ou O atleta , fica enriquecida com a identidade de seu modelo: Joaquim Antonio Vives Terrats.

(^1) Sou grata a Elias Gaston, presidente do Centre Picasso d’Horta, pelas informações e pela atenção nos contatos quando decidi escrever este artigo e a Ana Gonçalves Magalhães pela revisão da tradução. (^2) Em PERUCHO, Joan. Picasso, el cubisme i Horta de Sant Joan. Tarra- gona: Museu d’Art Modern. Barcelona: Columna, 1993, p. 164. (^3) BRASSAÏ. Conversas com Picasso. Trad. Paulo Neves. São Paulo: Cosac e Naify, 2000, p. 112. (^4) Segundo Pierre Daix, 1995, p. 181, citado por RICHARDSON, John. A life of Picasso , volume II, 1907-1917. New York: Random House, 1996, p. 47. (^5) Em PERUCHO, Joan. Picasso, el cubisme i Horta de Sant Joan. Tarra- gona: Museu d’Art Modern. Barcelona: Columna, 1993, p. 164. (^6) Antonina Vallentin diria que “esta se decompõe e se organiza da melhor maneira diante de seus olhos. Ali há aquela luz que se torna um fator pujante da repetição do ‘visto’ em massas compactas”. VALLENTIN, Antonina. Pablo Picasso. Paris: A. Michel, 1957, p. 173. Já Cowling comenta que “a produção de Picasso durante aqueles meses ... era cuidadosamente integrada, sua abordagem disciplinada: há inquestionavelmente um estilo de Horta”. COWLING, Elizabeth. Picasso : style and meaning. London: Phaidon, 2002, p. 212.

(^7) Citado em RICHARDSON, John. A life of Picasso : volume II: 1907-1917. New York: Random House, 1996, p. 446, nota 25. (^8) Mensagem eletrônica enviada domingo, 31 de dezembro de

(^9) RICHARDSON, John. A life of Picasso : volume II: 1907-1917. New York: Random House, 1996, p. 126. (^10) PERUCHO, Joan. Picasso , el cubisme i Horta de Sant Joan. Martine Joulia; Susie Pickard; Julie Funnell. trad. Tarragona: Museu d’Art Modern; Barcelona: Columna, 1993, p. 166. (^11) COWLING, Elizabeth. Picasso : style and meaning. London: Phaidon, 2002, p. 212. (^12) BALDASSARI, Anne. Picasso and photography : the dark mirror. Paris: Flammarion, 1997, p. 77. (^13) Mensagem eletrônica enviada ao MASP, no domingo, 14 de janeiro de 2007. (^14) As outras obras de Picasso que o retratam, segundo infor- mações gentilmente enviadas pelo Centre Picasso d’Horta, são Torso (Homem nu) , óleo sobre tela, 65 x 42,4 cm, do Pola Museum of Art de Kanagawa, Japão, e Torso (Homem nu com braços cruzados ), carvão, têmpera e aquarela sobre papel, 65,5 x 49,5 cm, Museu Hermitage, São Petersburgo, Rússia.

A identidade do Atleta de Picasso

1 Na primeira casa à direita ficava o Café de Joaquim Antonio Vives, em Horta de San Juan

2 Joaquim Antonio Vives, que em 1909 posou para O atleta de Picasso, fotografado pelo próprio artista

3 Pablo Picasso. O atleta (Busto de homem) , 1909